Emoções digitais

Terapeutas estão com agendas lotadas e os consultórios estão vendo filas se formando em suas recepções. É uma epidemia. Estamos todos contaminados com o vírus da ansiedade.

A história da informação é a história do ser humano. A capacidade de lidar com a realidade da qual sempre tirou impressões é a maldição que a raça humana carrega como lastro de sua existência nesse mundo. Desde que se percebeu como personagem nesse espaço, interagindo com a natureza de onde tirava sustento e até inspiração para ter ideias, o ser humano luta incansavelmente para deixar uma marca única, como se tentasse driblar a morte e dizer, de alguma ou muitas formas, que esteve “aqui”. Um aceno para o que chamamos de eternidade.

Há milhares de anos, quando um de nossos avós gravou a forma de sua mão numa rocha, usando algum tipo de tinta natural, uma explosão aconteceu na mente desse personagem, o que representava algo maior que estava acontecendo também em nossa espécie. Sabíamos de nossa existência, ao contrário de todos os outros animais, e não aceitávamos simplesmente nascer, crescer e morrer. Essa angústia nos levou rumo à criatividade, o que seria o divisor de águas entre o silêncio de um passado completamente desconhecido e um novo futuro que seria criado e escrito de muitos e infinitas formas, o que faria toda a diferença dali em diante. A história do homo sapiens começa quando ele entende que seus pensamentos precisam ser registrados.

Hoje, a Internet é uma prova disso tudo. Se olharmos pela perspectiva histórica, a sua criação coroa uma busca antiga para concentrar todo o conhecimento humano. A maioria dos grandes nomes responsáveis por expansões de impérios sempre defendiam o conhecimento como algo poderoso, que deveria ser incentivado e protegido. Seria uma questão de tempo a criação de uma ferramenta capaz de reunir todo o conhecimento humano, bem como a capacidade de monitorar e, principalmente, exercer algum tipo de poder sobre o maior número possível de pessoas.

Se a gente olha para trás, prestando atenção em tudo o que foi criado, principalmente nos últimos 500 anos, percebemos que a maior parte das criações está ligada à produção de conhecimento. Junto disso estão os mecanismos de transporte, é claro, mas a sede de saber o que acontece do outro lado do mundo, e mesmo em lugares que conhecemos, mas não dominamos ou não tempos licença para entrar, nos fez criar recursos para superar essas limitações. A informação tinha se tornado o bem mais precioso e nada poderia interromper essa revolução.

A ansiedade humana por romper barreiras, em busca de superação de desafios e, com isso, evoluir para novos patamares, criou o mundo que conhecemos. No entanto, chegamos a um ponto de virada. Uma daquelas esquinas da história, quando grandes eventos marcam uma quebra de paradigma. O século XX e todas as suas ebulições permitiu um salto gigantesco em nossa capacidade criativa. As coisas já não aconteciam na mesma velocidade. A tecnologia digital mudou tudo e reinventou a ideia de tempo e espaço. Em resumo, a sociedade que sempre precisava esperar décadas, às vezes, séculos para ver grandes mudanças sociais, agora as percebe no intervalo de anos, às vezes, meses. Isso é assustador para um cérebro que até pouco tempo tinha “tempo” para se adaptar às mudanças.

Agora, a velha mente humana precisa se reinventar ou entrar em colapso.

Toda essa inundação de informações, que ocorreu nos últimos milênios, gradativamente nos deixou saturados com todas as suas possibilidades. Hoje, não é nem o volume de informações que podemos acessar, mas a velocidade que tudo isso acontece. A máquina digital chamada Internet está programada para dar lucro. Tudo está online, absolutamente tudo. Tente se imaginar desconectado por uma hora inteira. Tente, agora, se ver sem conexão por um dia. Quiçá uma semana. Impensável, certo? Parece estranho, mas é como querer impor que uma pessoa fique sem respirar, comer ou beber água.

Não existimos se não estamos conectados.

Nossas vidas parecem depender do quanto somos capazes de surfar na internet. Nosso conhecimento de ferramentas digitais definem o quanto podemos nos divertir e encontrar algum tipo de felicidade.

Esse é um momento crítico. Não houve tempo suficiente para nossos corpos se adaptarem às exigências e às consequências de um uso tão massivo e contínuo de tantos mecanismos digitais, que mudam da noite para o dia, oferecendo recursos sem fim, que mais nos sufocam do que fazem bem. Mas, isso é só uma opinião simplista de alguém que está olhando de uma perspectiva apenas. Entretanto, os números estão aí. Um mar de gente está sob a pressão de um novo sistema que se instalou e domina toda a estrutura mundial. Governos sucumbem e se elevam praticamente do nada por causa das redes sociais. E isso vale para empresas e pessoas, não importam de onde vem e como chegam lá.

O poder da tecnologia digital só deixa claro a necessidade de termos foco em nossas emoções.

A velocidade que assola nossas vidas empobrece nossa capacidade de tomar decisões. E isso pode ser um chão movediço, onde a maioria de nós acabará sucumbindo por não estar prestando atenção. Quanto mais nos debatemos, mais rápido somos engolidos pela areia. Mentes poderosas estão investindo em terapias, novas formas de lidar com suas emoções, entendendo que os excessos digitais comprometem o nosso frágil cérebro biológico.

Para se dar bem em um mundo digital, talvez seja preciso exatamente ir mais devagar, sem se deixar encantar com o canto de uma seria feita de pixels.

Não importa o quanto nosso mundo seja dominado por coisas eletrônicas. Precisamos olhar nos olhos uns dos outros e sermos capazes de nos encantar com as surpresas que só as pessoas podem nos oferecer. Seres humanos ainda são o que a natureza criou de mais interessante, mesmo que encontremos fatos sombrios sobre isso. Mas, é exatamente aí que reside a possibilidade de alguma luz surgir, pois odiamos viver na escuridão, e não suportamos viver sem o toque de outro ser humano, mesmo que tenhamos criado ferramentas para evitar isso.

Talvez seja essa a razão de tantos consultórios abarrotados de gente em busca de se reconectar com a sua essência, com as suas origens, que, com certeza, não são digitais.

Precisamos reaprender a nos emocionar.

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