Daniel (Antônio Sabóia) é um Policial Militar de Coritiba que está está afastado do trabalho devido a um episódio de violência. Ele cuida sozinho do pai que tem Alzheimer, a mulher o largou, e ele faz bicos como segurança para conseguir dinheiro. As coisas só não estão piores porque Daniel conversa pela internet diariamente com uma mulher chamada Sara. Eles nunca se viram, já que ela mora em Sobradinho, na Bahia. Mas, ao que parece, existe uma relação tranquilizadora entre os dois. Isso até o dia em que Sara não responde mais as mensagens de Daniel. Ele pega o carro e cruza o país atrás dela.
“Deserto Particular”, dirigido e escrito por Aly Muritiba, é um road movie diferente. Daniel não vai se conhecer durante a jornada, e sim ao voltar dela. Se o caminho de ida é cercado por uma expectativa enorme para entender qual é o seu verdadeiro destino, quando ele finalmente encontra Sara, Daniel se vê sem direção nenhuma.
Não é um spoiler dizer que Sara, que é interpretada pelo ator Pedro Fasanaro, é diferente do que Daniel imaginava. Apesar da descoberta dessa informação acontecer praticamente na metade do filme, é a reação do personagem principal que conta, que abarca a tensão e explora todas as nuances que um sentimento tão incontrolável quanto o amor – ou a repulsa – pode ter.
“Deserto Particular” toma outro rumo quando deixa o ponto de vista de Daniel e salta para os olhos de Sara. Essa mudança expande o universo do próprio protagonista, ainda que não trate da vida dele diretamente. Como em um encontro de dois rios que vão desaguar na imensidão do mar, saber onde cada um nasce faz diferença na hora do encontro.
Sobradinho, na Bahia, e Juazeiro, em Pernambuco, são dois estados separados por um rio. É um símbolo poderoso que o filme usa para conectar, pra ligar duas histórias que vivem não só em espaços opostos, mas também em ritmos e sensações por elas mesmas separadas.
Aly Muritiba dirige essa história com uma beleza infinita, plástica, que aproveita o sertão como um elemento metafórico importante para a compreensão sobre os desertos internos que Sara e Daniel carregam dentro de si. Os dois atores também estão ótimos.
É preciso destacar o quanto o texto de “Deserto Particular” é bem escrito, o quanto o roteiro é sutil e enérgico, cultivando uma série de tensões e sensações sem que elas se percam em conclusões comuns. Os temas discutidos ao longo do filme, como machismo, preconceito, religião, cultura regional, vão se conectando com muita delicadeza, e guiando o espectador para dentro dessa jornada também. A gente não olha de fora.
O que “Deserto Particular” ainda consegue fazer de bárbaro é concentrar elementos, adicionar camadas a história de Daniel e Sara para desvendar o que há de mais puro nesse encontro, o que os ligou quando eles estavam separados por milhares de quilômetros. O fio de Ariadne que Sara dá, mas que Daniel recusa, é uma ajuda para que ele descobrisse a saída do labirinto onde se meteu. O que ele finalmente percebe é que os monstros que precisa vencer estão do lado de fora, à espreita no deserto.