Você pensa em português?
Quando você “conversa” com você mesmo aí dentro da sua cachola, você fala em português?
Será então, que o seu pensamento pode ser mais, ou menos elaborado, dependendo da sua língua e do seu vocabulário (e suas devidas limitações)?
Será que quanto mais palavras você conhece, melhor você consegue raciocinar?
Uma coisa sem nome não existe?
Essas questões são interessantes e misteriosas demais e não tenho a pretensão de me aprofundar aqui no post. Mas para os curiosos, é um belo convite para ir atrás.
Realmente faz sentido.
Se uma criança tem uma caixinha com 6 lápis de cor e uma outra tem uma caixinha com 48, teoricamente a segunda tem mais condições de se expressar e elaborar um desenho.
Porém, como sabemos, nem sempre “possibilidade” significa “probabilidade”.
Essas charadas já despertaram a curiosidade de antropólogos, psiquiatras, psicólogos, filósofos e linguistas e fazem parte de um conceito chamado “relatividade linguística”, que investiga a relação entre linguagem e pensamento.
A linha mais radical diz que sim, nossa língua influi diretamente na maneira como pensamos porque o pensamento é feito de palavras.
A linha menos radical diz que realmente existe uma influência, mas ela não é determinante nem limitante, já que o pensamento extrapola a língua.
Enfim, um dos exemplos mais fascinantes desse debate são mesmo as cores.
Alguns povos percebem mais cores que outros, porque existem mais nomes de cores na língua!
Mas se uma língua não tem uma palavra para “roxo”, você deixa de enxergá-lo?
Ou talvez iria considerar o roxo como um azul mais afrescalhado?
Se uma cor não tem nome ela não existe?
Todos nós, seres humanos (pelo menos a maioria), somos equipados com um par de olhos capaz de perceber as mesmas nuances no espectro de cores. Mas o número de cores que as pessoas reconhecem varia de cultura para cultura por causa da língua.
Por exemplo, para muitas pessoas, verde e azul são a mesma cor.
É que na língua delas existe apenas um termo para as duas cores. Elas enxergam a diferença, mas consideram uma mudança apenas de tonalidade.
Aliás, a distinção entre o verde e o azul é um divisor de águas na evolução linguística de uma cultura. Segundo um estudo feito em 1969 ( Brent Berlin and Paul Kay‘s 1969 Basic Color Terms: Their Universality and Evolution), só depois que e o verde e o azul viram duas cores distintas é que surgem o marron, o rosa, o roxo, o laranja e o cinza.
E é aqui que a coisa fica realmente bizarra.
Porque a evolução de todas as línguas em relação a cores segue sempre A MESMA sequencia.
A primeira distinção que fizemos, lá na idade da pedra, quando inventamos a primeira língua, foi o branco e preto (claro e escuro). Depois vieram o vermelho e o verde (talvez por causa de sangue,perigo / planta,comida).
A sequencia é essa:
Estágio I: Preto e branco
Estágio II: Vermelho
Estágio III: Verde OU amarelo
Estágio IV: Verde E amarelo
Estágio V: Azul
Estágio VI: Marron
Estágio VII: Roxo, rosa, laranja e cinza
Pô, azul é o quinto estágio? Com esse céu enorme sobre a gente? E marron vem antes do laranja? Eu não entendo nada de cores mesmo.
Enfim, o assunto é mesmo demais. Relação entre palavras e pensamento. Tem ainda aquela famosa história da palavra “saudade”, que teimamos em acreditar que só existe em português (então só nós sentimos?). Ou as dezenas de termos para “neve”, usado pelos esquimós.
O negócio é decorar o dicionário e torcer por pensamentos melhores.
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Sim. Quantos sentimentos estranhos a gente não tem e não encontra definição pra eles?
Sim. Existe!!
Existe
Se não está na língua, não está na cultura nem no conhecimento humano. Pode existir, mas foge à razão humana. Coisas inefáveis!
Recuso-me a escrAver!
Existe e podemos usar as palavras existentes para descrevê-la e distingui-la
Não. Ela pode ate existir de fato. Nao so de fato vive o homem. O homem só existe quando ele é entendido por outro e esse outro o nomeia.
sim
Tem aquele exemplo das descrições marítimas em épicos gregos, em que os mares são “cor de vinho”.
É sim, existe.
“Escrava”?
Claro que existe!
O meu sentimento em relação à política nacional, por exemplo, ainda não tem nome, no entanto ele é tão real quanto o celular que seguro nas mãos nesse momento.
Inefável!
Nefando chega mais perto!
:P
Olha amor Ludimila Pinheiro
Existe. Só não se pode nomea-la.
Existe! Mas parece um koan: qual é o som da árvore que cai no meio da floresta?
Se ninguém ouviu, existiu um som?
Mas como saber que ninguém ouviu?! Parece-me sempre um pouco de egocentrismo da nossa parte imaginar, neste e outros casos de exemplo, que ninguém viu, ouviu, sentiu ou viveu a não ser que se converse com todos os seres vivos da terra e de outros planetas e tenha-se, de alguma maneira, a garantia de que de fato todos foram entrevistados…entende?! Uma pira hahahaha
É o princípio da incerteza. ;) Procura por “gato de Schrödinger”… Aí sim vc vai pirar. hahaha
existe!
No momento de sua percepção, a coisa sem nome inicia o desafio pelo seu batismo…. o novo nos intriga e o cérebro exige uma etiqueta pra guardar a nova informação no devido “lugar”
ADOREI!
claro que existe, e se chama “coisa”
Wittgenstein na área rsrs
Sei que este é um texto antigo, mas ao ler um texto recente ele apareceu aqui do lado e o título me chamou a atenção. Comecei a ler. Achei mais interessante ainda que o título. E ao chegar nas cores e sua sequencia evolutiva na linguagem aí a casa caiu. É que agora que eu percebo que, por questões políticas, a utilização da cor vermelha pode ser proibida em determinado país da America latina, país até importante por sinal, fico pensando o que será que vai acontecer com as outras cores. Ainda mais por ser uma cor tão básica, fundamental na composição das demais. Acho que vamos ter muitos problemas. Mas acho que os sábios políticos darão um jeito. (isto tudo foi uma ironia, exceto que achei o texto excelente e divertido!!!)
Uma outra coisa que pode entrar em atrito com essa teoria é de que tem-se de considerar que a única forma de pensar é através das faculdades racionais e lógicas. Isto é, não é exatamente necessário que organizemos o pensamento de forma racional – categorizante – para entender as coisas. A razão é muito moldável: Um garfo aqui pode ser um coçador de costas lá, e por aí vai. Portanto, não se entende o verdadeiro sentido do objeto apenas racionalizando-o.
Uma outra coisa que pode entrar em atrito com essa teoria é de que a única forma de pensar é através das faculdades racionais e lógicas. Isto é, não é exatamente necessário que organizemos o pensamento de forma racional – categorizante – para entender as coisas. A razão é muito moldável: Um garfo aqui pode ser um coçador de costas lá, portanto, não se entende o verdadeiro sentido do objeto apenas racionalizando-o.
Aqui tem um podcast muito bacana sobre cores e como as enxergamos (homens x mulheres) de formas diferentes, como os animais enxergam cores, etc. Super vale a pena.
http://www.radiolab.org/2012/may/21/
É o tipo de coisa que eu conversaria com a minha amiga Joice Kelly Tozato.
Hahaha…verdade! Sinto falta dos nossos papos cultos!rsrs
Deu uma tonturinha boa esse texto.
Acho que, o pensamento comunicável é verbal, se estrutura a partir de palavras para transmitir uma informação. Mas as formas individuais de se pensar não estão necessariamente ligadas a língua, podemos pensar espacialmente, por meio de imagens.. a necessidade de expressar e tornar entendível o que pensamos, nos leva a organizar um roteiro e verbalizar as ideias.
Uma coisa que me pegou no texto foi.. "…porque o pensamento é feito de palavras…"
Como sera que um surdo pensa?
Acho q msm considerando um determinado sinal como palavra.
Nao consigo imaginar ele formulando uma ideia, "visualizando" esses sinais em sua mente…
Pois é! E como faziam os homens das cavernas? Tb não pensavam? Esse quadro com a frase do Gandhi tem uma pista boa porque fala que os pensamentos viram palavras e não o contrário. Mas aí… do que é feito esse tal pensamento? Até agora não tenho certeza absoluta que eu falo comigo mesmo usando palavras :)
Esse último parágrafo seu me lembrou de um livro bem divertido que eu li chamado 'I never knew there was a word for it', que fala sobre palavras e expressões curiosas em determinadas culturas que podem ter ou não traduções em outras línguas. Interessante para os estudos the tradução! :)
Ernesto Diniz, o meu livro tbm elogiado pelo Stephen Fry xD
Ah, eu lembro desse livro! é bem simpático mesmo!
Pustz WB, todo dia você posta algo louco e legal. Parabéns cara! =D
=D
WB sempre com ótimos posts que me fazem passar hora clicando em links e hyperlinks.
A maior parte desse mérito é seu ;)
Tenho dúvidas se o verde água é o mesmo azul piscina.
ou o conhecimento nos limita? se pensar que as crianças são muito mais imaginativas que adultos justamente pq ignoram axiomas, paradigmas e afins e inventam a própria realidade, quem conhece mais (palavras neste caso) está preso a elas, não poderá chamar o 'roxo'de 'azul afrescalhado' pq sabe que roxo é roxo.
O poeta Manoel de Barros tem varios poemas neste sentido. Olha dois deles:
"precisa de nome? era azul e voava."
e
"O rio que fazia uma volta atrás de nossa casa, era uma imagem de um vidro mole que fazia uma volta atrás de casa.
Passou um homem depois e disse: essa volta que o rio faz por trás de sua casa se chama enseada.
Não era mais a imagem de uma cobra de vidro que fazia uma volta atrás de casa, era uma enseada.
Acho que o nome empobreceu a imagem."
Boa!
Ótima discussão. A questão do repertório linguístico influenciar na percepção cognitiva é um mito. Não ter uma palavra que expressa certa coisa não a torna invisível, apenas altera a forma de expressão (através the língua) daquilo. Um livro perfeito sobre o assunto é esse: http://www.amazon.com/Through-Language-Glass-Different-Languages/dp/0099505576/ref=sr_1_2?ie=UTF8&qid=1349803481&sr=8-2&keywords=through+the+language+glass. Vale a leitura.
Bem interessante!
Otima dica, obrigado