A inteligência em massa já começou
Tá, tá, tá.
Eu sei que muita gente vai falar “que nada, estamos emburrecendo”, ou “a IA jamais vai substituir a inteligência humana” ou “nosso QI médio está indo pro vinagre, isso sim”.
Eu concordo, mas também discordo.
Acho sim que exista esse efeito colateral no curto prazo e entendo uma reação em defesa da “faísca de humanidade”, que nos coloca como seres únicos, como de fato somos em muitos e impressionantes aspectos. Mas acho também uma miopia danada não se imaginar o quanto de fato a humanidade vai mudar e o quanto as chances de uma evolução mais acelerada aumentaram drasticamente com a chegada da IA. Tenho plena certeza de qua a tecnologia tem evoluído muito mais rápido E MELHOR do que o ser humano, mas tenho fé que as coisa melhorem em forma de simbiose, muito em breve.
Mas o post não é filosófico. é sobre uma conversa boa e mais factual sobre este tema, que rolou na semana passada.
Max Levchin, fundador do Affirm e parte da lendária “PayPal Mafia” (apelido dado ao grupo de ex-fundadores e primeiros executivos do PayPal que, depois da venda da empresa ao eBay em 2002, passaram a criar ou liderar algumas das maiores companhias de tecnologia do mundo. E sim, Elon Musk é um deles), trouxe uma ideia provocadora: a IA está aumentando o QI médio da humanidade — ou pelo menos de quem usa essas ferramentas. Ethan Mollick chama isso de “inteligência em massa”: quase 1 bilhão de pessoas com acesso a modelos de nível genial.
Quase um bilhão de pessoas usam chatbots de IA regularmente. O ChatGPT tem mais de 700 milhões de usuários semanais. Gemini e outras IAs líderes adicionam centenas de milhões a mais. Em minhas postagens, muitas vezes me concentro nos avanços que a IA está fazendo (por exemplo, nas últimas semanas, os chatbots OpenAI e Google AIs ganharam medalhas de ouro na Olimpíada Internacional de Matemática), mas isso acaba ofuscando uma mudança maior: estamos entrando em uma era de Inteligência de Massa, onde a IA está se tornando tão acessível quanto uma pesquisa no Google.
Não é um implante futurista, mas um efeito prático. A IA eleva o chamado piso de competência (o nível mínimo de capacidade ou desempenho que uma pessoa consegue atingir. No contexto da IA, significa que essas ferramentas elevam o patamar básico do que qualquer usuário consegue fazer, mesmo sem ser especialista).
O que antes exigia anos de experiência ou recursos caros, agora cabe em um prompt bem formulado.
Lembrei desse comercial
Esse papo me faz lembrar de um dos meus comerciais favoritos, que a IBM veiculou no Super Bowl em 2003, em que um garoto personificava o LINUX e vários famosos (entre eles o Muhammad Ali) iam ensinando e dando dicas sobre suas especialidades. Quando assisti pela prmeira vez, pensei: essa metáfora um dia será literal e o menino será realmente apenas um menino aprendendo com a ajuda tecnologia. Assiste aí, vê não é o máximo que isso seja exatamente o que a IA pode estar fazendo (agora ou muito em breve):
Do Moloch à “enshittificação”
Toda grande plataforma parece piorar com o tempo:
-
Google sufocado por SEO spam.
-
Airbnb cheio de taxas e armadilhas.
-
Redes sociais virando fábrica de indignação.
O 12 Grams of Carbon batizou isso de “enshittification”. Scott Alexander, em 2014, já descrevia o demônio competitivo “Moloch”: o ciclo onde todos perdem tentando sobreviver à concorrência.
Até aqui, a lógica era clara: IA só aceleraria esse processo. Mais spam, mais manipulação, mais corrida para o fundo do poço.
A hipótese da “unshittificação”
Mas e se for o contrário? E se a IA, ao nos deixar mais inteligentes, quebrar o ciclo?
-
SEO slop: assistentes filtram resultados e ignoram manipulações, tornando inútil gastar milhões em truques.
-
Airbnb: IA lê milhares de reviews, calcula o custo real (com taxas escondidas) e alerta contra anfitriões desonestos.
-
Feeds: IA detecta conteúdo artificial e bloqueia antes que roube sua atenção.
De repente, enganar fica caro demais. Criar valor vira a estratégia mais eficiente.
O “paradoxo da unshittificação digital” de Max Levchin é a hipótese de que a IA pode inverter a degradação natural das plataformas online (enshittification), não piorando a experiência, mas tornando os usuários mais inteligentes e capazes de filtrar manipulações.
Educação: o terreno fértil
Se há um setor que mostra o potencial, é o ensino. A Alpha School já usa tutores de IA que:
-
Fazem alunos avançarem um ano em 20–30 horas.
-
Identificam lacunas básicas (como multiplicação de 3ª série) e corrigem em tempo recorde.
-
Transformam estudantes em jovens capazes de construir negócios reais e aplicar o que aprendem.
Imagine isso em escala: 1 bilhão de crianças com aprendizado 10x mais rápido se tornam adultos 10x mais difíceis de enganar. O ciclo de degradação digital quebra quando os “alvos” ficam inteligentes demais para serem manipulados.
O verdadeiro twist da IA
A solução não seria um supercérebro artificial benevolente que governa do alto. É algo mais orgânico: inteligência geral distribuída. Cada pessoa equipada com IA se torna um nó em uma rede coletiva que aumenta a capacidade de julgamento, crítica e criação de valor.
Talvez não precisemos derrotar Moloch com uma IA sobre-humana. Talvez baste parar de alimentá-lo.