Que atire a primeira pedra quem nunca errou no trabalho!
Sim, o designer projeta para humanos mas será que ele também se reconhece como humano? Ou seja, se errar é parte da condição humana, como o designer lida com o SEU próprio erro?
Obviamente é inevitável: por mais acertos que se tenha a felicidade de realizar, a possibilidade do erro é inerente—o outro lado natural da moeda. Mas o designer é capaz de reconhecer isso com naturalidade? Seja a ignorância num determinado assunto, um entendimento errado, uma falha de comunicação, uma pressa (ou até mesmo a falta dela) que prejudique um projeto em andamento, ou até mesmo uma simples escolha ruim que custa dinheiro e horas de desenvolvimento até que seja revertida… os erros estão por aí, distribuídos pelo cotidiano dos profissionais.
UX Design: a disciplina dos seres “perfeitos”
É preciso reconhecer que, como uma disciplina relativamente nova e com a aura de ser a responsável por revolucionar a interação entre humanos e negócios, gerando a insaciável (e super valorizada) inovação, o UX Design está beatificado, colocado acima do bem e do mal e praticamente imune à frágil condição humana.
Afinal, UX designers não erram, certo? E quando o fazem, a culpa é do briefing que não estava claro, do tempo e do orçamento curtos que não permitiram um trabalho mais aprofundado, do cliente que não entende nada de inovação e novas tecnologias, do time de desenvolvimento que jogou contra ao buscar simplificar as soluções, da “pecinha na frente do computador” que não foi capaz de entender a interface, da impossibilidade de testar a solução… Enfim, as justificativas são as mais diversas mas, em geral, é raro encontrar o designer que reconhece que ele errou mesmo.
Mas devagar com o andor que o santo é de barro!
É evidente que em muitas situações o designer pode estar correto ao apresentar uma dessas justificativas para um resultado ruim. Afinal, quando se trabalha com inovação, lida-se com situações em que os novos parâmetros estabelecidos (e pouco experimentados) falham. E a falha caminha lado a lado com a inovação. Entretanto, é justamente nas situações em que o designer falha — mas demonstra capacidade e maturidade para lidar com este engano—que ele abre espaço para conquistar a confiança e o respeito de seus companheiros de trabalho.
Saber arcar com as consequências de uma falha de julgamento não é carregar o mundo (da culpa) nas costas, como um Prometeu que deu bola fora com o “conhecimento sagrado”, mas é portar-se efetivamente como um team player, com inteligência emocional e humildade para assimilar o golpe e ter a capacidade de dar a volta por cima junto com o time, reforçando os vínculos de transparência e confiabilidade das relações não só dentro do time, mas também com a gerência e até mesmo clientes. Sem culpados, mas com cumplicidade na busca por melhores soluções coletivas e responsáveis.
“Quem entende desse negócio sou eu!”
Já parou para pensar que o Design Centrado no Humano pode acabar enchendo o designer de soberba?
Uma vez que a tecnologia empoderou os consumidores, proporcionando-lhes informações de fácil acesso e uma miríade de opções de consumo, o designer está numa situação privilegiada de contato com este player fundamental — e, em muitos casos, ele atua como verdadeiro representante dos interesses destes consumidores na concepção e construção de soluções que lhes beneficiam. E este privilégio de ouvir e ser o porta-voz do consumidor muitas vezes acaba colocando o designer naquela postura praticamente acima do bem e do mal. Pretensamente invulnerável e infalível.
No entanto, é neste momento que o designer deve relembrar das sábias palavras do tio Ben Parker:
“Com grandes poderes, grandes responsabilidades!”
Mais do que soberba, esta posição privilegiada do designer junto ao consumidor representa uma oportunidade para que o profissional exercite em especial a empatia não só por estes usuários mas também pelos demais stakeholders do projeto, posicionando-se como ponte que encurta distâncias, através de informações preciosas e, principalmente, oportunidades de engajamento com o time — um verdadeiro “projeto centrado no humano”.
Pessoas, Tecnologia e Negócios
Vale lembrar o óbvio: a experiência do usuário (ou “user experience, ou ainda para os íntimos “UX“) é composta por considerações que envolvem pessoas, negócios e tecnologia. Estas três dimensões deveriam estar o tempo todo direcionando e intermediando o trabalho do UX designer, até como meio para alcançar resultados coerentes, equilibrados e efetivos.
Isso porque a falta de harmonia entre estas dimensões aumenta consideravelmente a probabilidade de erro: com tecnologia demais, a experiência do usuário pode ser muito complexa e isso acaba afetando o resultado do negócio. Com tecnologia de menos, experiência e negócio também podem ter resultados aquém do esperado.
Já um foco exagerado no negócio (que infelizmente é um cenário bem comum) pode gerar uma experiência frustrante para o usuário mesmo num contexto em que a tecnologia está adequada. Enquanto que um menosprezo ao negócio pode fazer com que não se feche as contas no final do mês.
Em outro artigo, já foi possível discorrer sobre os cenários em que as empresas fingem que escutam os usuários. Porém, o oposto também pode ser prejudicial: o designer que não consegue ser objetivo na definição de personas ou nas análises dos feedbacks, perdendo-se numa espiral infinita de causa e efeito, ou mesmo quando ele ignora limitações técnicas e necessidades de negócio, hipertrofiando uma experiência pouco efetiva.
Erro grave!
É aí que reside uma versão defeituosa de Design Centrado no Usuário em que o designer despende tanta atenção às pessoas que acaba descuidando dos objetivos de negócio que permitem garantir a viabilidade econômica da iniciativa ou que desconsidera as possibilidades do meio tecnológico, truncando a disseminação de informações de qualidade, a facilidade de uso e, em última instância, as interações entre humanos e negócios.
Saber errar pode ser um bom negócio
Ninguém erra porque quer. Porém, como já mencionado, falhar é algo inevitável na vida de qualquer um. Assim, uma vez que vai acontecer, o melhor a fazer é saber encarar as consequências de um deslize e, mais importante, ter a capacidade de remediar a situação.
Afinal, uma falha pode ser uma oportunidade.
Certamente uma óbvia oportunidade de aprendizado, mas também oportunidade para empatizar com “a pecinha na frente do computador”, oportunidade para estreitar laços de confiança e reciprocidade com o time, oportunidade para experimentar novas maneiras de se realizar tarefas e até mesmo oportunidade de se levar menos a sério e encarar a vida com mais leveza.
Na realidade de negócio dos dias atuais, um erro pode custar muito dinheiro. E cada vez mais o trabalho do UX designer ter uma influência significativa nos resultados do negócio — inclusive em sua lucratividade. Assim, as falhas de um designer dificilmente serão vistas com bons olhos.
Por isso, a capacidade de saber reconhecer as próprias falhas e, principalmente, conseguir aprender com os enganos e remediar seus efeitos podem ser habilidades preciosas para um UX designer. Até mesmo valorizando-o frente ao time e aos responsáveis pela operação, como um profissional de confiança e cheio de recursos.
Afinal, errar é humano — e trabalhar com humanos é a especialidade do designer.