Alguns pontos interessantes sobre o efeito da crise do novo coronavírus no mundo do texto publicitário e do branding:
1. Sai a proximidade, entra a distância.
O branding moderno, baseado na venda “não de produtos, mas de experiências” se pautou com exaustão na ideia de união, conexão, proximidade, companhia, estar junto. Com o isolamento social, se vê um movimento único em prol da…distância! Tirando uma crise dessas, seriam inimagináveis as campanhas ostentando o afastamento entre as pessoas – muito menos casos como o dos logos do Mercado Livre, Audi e Volkswagen, se adaptando para ressignificar a noção de proximidade.
2. Mais juntos do que nunca
Por outro lado, a redação publicitária sempre fez dos extremos e das contradições grandes argumentos de texto. Por isso, falar de “estar junto” em momentos de isolamento ainda é potente (e por vezes até mais potente que em tempos normais) – juntos, mesmo de longe; mais próximos do que nunca. Um exemplo é a Latam, cujo slogan é “Juntos, mais longe” (Together, further), que tem explorado a adaptação do conceito pra o contexto (Estamos juntos, fazendo a ajuda voar longe).
3. O branding ao avesso
De volta ao assunto “produtos vs experiências”, a crise resgatou o fundamental da prática publicitária raiz. Em vez de campanhas associando produtos (geralmente supérfluos) a grandes realizações de vida, status e projeções de futuro, a mensagem agora volta a ser objetiva: “temos álcool em gel”, “encontre o que você precisa hoje”, focada nos itens de primeira necessidade. A tensão é tanta, que felizmente se vê uma comunicação que prioriza e respeita o que é essencial, e o branding em 2020, finalmente, é pautado na resolução real de problemas. Agora é imaginar o quanto disso vai durar depois que a tempestade passar – e mesmo se, quando a crise econômica apertar, o quão ético ainda será o texto publicitário.
4. Responsabilidade social
Do ponto de vista de engajamento corporativo na sociedade, o momento não poderia ser mais significativo. É a Ambev e Natura que passaram a produzir álcool em gel, a Reserva que está usando seus tecidos para produzir máscaras e até o Nubank, que direcionou R$ 20 milhões da verba de marketing para ajudar os clientes na crise. Até então, ações desse tipo eram muito mais pompa e PR do que tudo. É claro que tais intenções persistem, mas me parecem, de fato, mais conscientes e relevantes. O cenário é excepcional, portanto se espera muito mais das empresas – em tempos assim, um videocase com trilha de filme não ajuda a conter o vírus nem a salvar pessoas.
5. A ironia do novo
Por fim, uma triste ironia. A publicidade, que sempre esgotou o uso de adjetivos que indicassem novidades, modernidade e atualização, como uma forma de diferenciação competitiva – um novo conceito, New Beetle etc – agora assiste a grandes transformações em virtude do: novo coronavírus. E como comentei acima, durante a crise, o “novo” não tem lá tanto valor assim. A gente só espera que tudo passe logo e que, em breve (mas sem pressa ou descuido), voltem os comerciais sobre os “novos tempos”. De coração, nunca estive tão ansioso pela volta desses comerciais.
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Excelente visão do momento e ótimas projeções Cris. Estamos vivendo um momento intenso não apenas com relação a aflição gerada pelo corona mas todos os reflexos sociais que vem disso
Juntos Mais Longe???? Mais???? Não seria “Mas”. A Latam está usando no seu site no Brasil: #LongeMasJuntos
Oi Michelle, é “mais longe” mesmo, traduzido do inglês “Together, further”
Não, se analisar o slogan em inglês “further” a ideia é dizer que juntos, se chega mais longe. Não é uma adversativa.