De volta aos clássicos: Um dia de Cão, de Sidney Lumet

Quando a Nova York suja e marginalizada de “Um dia de Cão” (Dog Day Afternoon, 1975) surge na tela e “Amoreena”, do Elton John, ao fundo, o espectador jamais imagina o que estar por vir. 
De volta aos clássicos: Um dia de Cão, de Sidney Lumet De volta aos clássicos: Um dia de Cão, de Sidney Lumet

Quando a Nova York suja e marginalizada de “Um dia de Cão” (Dog Day Afternoon, 1975) surge na tela e “Amoreena”, do Elton John, ao fundo, o espectador jamais imagina o que estar por vir.

Essa aparente calma que é vista de dentro de um carro, será completamente transformada quando Sonny (Al Pacino) e Sal (John Cazale) entram em um banco para roubá-lo.

O que era pra ter sido um trabalho rápido se estende por horas de um show midiático, com Sonny se intercalando entre uma figura admirada, zombada e frágil ao mesmo tempo.

Sonny é um personagem do seu tempo. Ex-combatente do Vietnã, é um homem que não se sente bem-vindo nesta sociedade corrupta e sem compaixão. Qual é a diferença da guerra com a cidade onde ele está?

Dirigido por Sidney Lumet com a vertigem de sempre, “Um dia de Cão” é temperado por um humor hiper sarcástico, embora nunca gratuito ou espalhafatoso, que mantém o enredo entre o absurdo e o real de maneira tensa até o fim.

Para se ter ideia da extrema habilidade do diretor na condução, o filme sequer tem trilha sonora.

De volta aos clássicos: Um dia de Cão, de Sidney Lumet

A maioria das cenas, claro, se passa dentro do banco. E com um espaço físico tão pequeno, Lumet investiga profundamente os sentimentos e reações humanos diante de questões como o sofrimento, o isolamento, a justiça, o delírio e o amor.

Aliás, é por amor que Sonny comete esse crime. Ele quer bancar a operação de troca de sexo do namorado. Essa motivação poderia ser uma chacota. Mais do que isso, poderia levar o filme para um beco moral conservador e até mesmo zombeteiro.

Mas Sidney Lumet foi um dos melhores diretores do cinema justamente por comprimir tanta força e verdade nas situações mais descontroladas. Na maioria dos seus seu filmes, o que vemos é uma radiografia sobre as imoralidades humanas; em como o indivíduo corrompe e é corrompido, não necessariamente pelo sistema, mas por um conjunto de situações-limite que todos vivemos.

Rede de Intrigas”, “O Veredicto”, “12 homens e uma sentença”, “Serpico” e até seu último e magnífico trabalho, “Antes que o diabo saiba que você está morto”, botam personagens solitários para lidar com uma força social incontrolável que logo se torna uma explosão coletiva.

De volta aos clássicos: Um dia de Cão, de Sidney Lumet

Em uma das melhores cenas de “Um dia de Cão”, Al Pacino improvisa e, ao ver a multidão que se formou diante do banco e no mau tratamento dos mais de 200 policiais presentes, grita “Attica!” várias vezes. A cena faz referência a um episódio sangrento da história americana. Em 1971, houve uma rebelião no presídio de Attica, em Nova York. Mais de 40 detentos foram mortos. Os presos exigiam o fim da censura, melhor atendimento médico e carcereiros negros e latinos…

“Um dia de cão” tem final abrupto e silencioso. Mas jamais indiferente com essa história real. Ao fechá-la com um corte seco, Lumet certifica-se que a ferida não se feche. Seus personagens representam a ironia que a vida pode ser. Mesmo que dia comece com uma canção de amor, a vida é suja, injusta e sobretudo cruel. Muito cruel.

Onde assistir: Globoplay

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