Com a adesão em massa às plataformas de STREAMING, a experiência de ir ao cinema tornou-se uma atividade de nicho. Conheça a história da sétima arte a partir da fotografia até a revolução tecnológica atual
Esta reportagem, no modelo “Long-form”, também conhecido como grande reportagem no Brasil, oferece ao leitor um panorama da história do cinema desde o seu nascimento até a revolução tecnológica, quando telas de cinema são substituídas por telas portáteis. A experiência de ir ao cinema torna-se um evento, o que antes era tido como rotina. Nesta grande reportagem assuntos como a frequência às salas de cinema, a chegada da televisão e o nascimento das plataformas de streaming tratam da quebra dessa rotina e de como a pandemia do novo coronavírus afeta diretamente o mercado cinematográfico.
Neste espaço você encontra vários aspectos da arte cinematográfica, como o momento em que a tecnologia permitiu que a fotografia ganhasse movimento — e, assim, o cinema nasceu — e como o surgimento do conjunto de empresas cinematográficas em Hollywood (EUA) elevou a sétima arte à categoria de entretenimento.
História do cinema: Imagem em movimento
Antes da origem do cinema, a sétima arte já era desenvolvida por meio da fotografia. Foi em 1872, na cidade de Palo Alto, Califórnia, que Eadweard Muybridge (1830-1904) fez um experimento fotográfico para capturar uma série de imagens reproduzindo a cena de um cavalo correndo.
Irmãos Lumière
Considerados como os inventores do cinema, eles descobriram o cinematógrafo, criado por eles em 1894. Tratava-se de uma caixa de madeira equipada com uma lente em sua parte dianteira e uma pequena manivela do lado direito.
Podendo ser considerado muito semelhante a outros métodos de projeção, como o kinetoscope, o cinematógrafo se diferenciava por ser mais leve, mais preciso, mais compacto e de mais fácil manuseio do que o kinetoscope, criado por Thomas Edison em 1891. Ele apresentava uma novidade: a mesma caixa que filmava também era capaz de projetar o filme.
Em 22 de dezembro de 1895, o cinema teve a sua primeira emissão na Europa com o filme L’Arrivée d’un Train en Gare de La Ciotat (1895) na cave du Boulevard des Capucines em Paris. Ao preço de 1 franco por ingresso, algumas centenas de pessoas assistiram à sessão, que durou cerca de 20 minutos.
Os irmãos Lumière ganharam o público de vez. Não só por revolucionarem a arte da fotografia, mas também pela arte de criar expectativa e assombro na plateia.
A ideia de filmar a chegada de um trem à estação e exibi-lo pela primeira vez em uma sala de cinema causou no público uma comoção muito grande e mostrou como o cinema iria “iludir” seu espectador.
Com a consolidação do cinema como forma de arte, veio outro grande influenciador dela, George Méliès (1861–1938): desenhista, escultor, pintor e manipulador de bonecos e marionetes. Aos 27 anos compra o lendário Théâtre Robert-Houdin em 1888.
O cinema desde de seu início (1894) teve como principal objetivo a representação da imagem em movimento. Sendo assim, sua exibição não possuía um local fixo, apenas a presença de, no começo, um lençol ou uma parede branca e um projetor que refletisse a luz em forma de imagem.
Ao caminhar do tempo as salas de cinema ganharam destaque no lazer das pessoas. Segundo o montador e historiador Máximo Barros (1930–2020), a primeira sessão de cinema ocorreu em 1896. O filme exibido foi Chegada do trem à estação, dos irmãos Lumière. Foi realizada na rua Boa Vista, esquina com a Ladeira Porto Geral, na antiga sede do Jóquei Clube de São Paulo.
Documentário e verdade
No festival É Tudo Verdade, referência no mundo do documentário mundial, contar verdades sobre a nossa realidade é o que o torna diferente. Aqui não se “atua”, se representa.
O documentário Quando as luzes das marquises se apagam (2018), do diretor Renato Brandão, aborda o nascimento da Cinelândia paulistana em 1896.
Por meio de recortes históricos da cidade de São Paulo, vemos a transformação do centro da cidade com a chegada do bonde elétrico e da construção de prédios de arquitetura moderna. Como, por exemplo, centros comerciais, ruas mais largas e a construção de edifícios mais altos para abrigar um número maior de salas de escritório.
O documentário retrata o nascimento de salas de cinema montadas em palácios paulistanos (Comodoro/Marabá/Marrocos/Ritz/Art Palácio/Cine Metro etc.) e que marcaram as décadas de 30 e 50.
O UFA Palácio, surge após o Cine Broadway, financiado totalmente pelos alemães. O cinema exibia em primeira mão as produções da UFA (Universum Film AG). Foi rebatizado para Art Palácio poucos meses após o início da Segunda Guerra Mundial. Ele marca o início da Cinelândia.
Nos anos 70 as salas de cinema ficam decadentes devido à inauguração desses espaços dentro de centros comerciais e shopping centers.
O cinema em São Paulo era assistido somente em casas ou lojas alugadas, era assim porque era ambulante. Vivia durante um espaço de tempo, 30 dias, em um local e depois, quando não tinha mais freguesia, se afastava do centro ou mudava de cidade.
A partir de 1907, os cinemas começam a ser fixos, e essa arte se tornou industrializada. Era possível comprar filmes mais baratos ou mesmo alugá-los, pois já existiam as distribuidoras. Máximo Barros também nos conta que, no Rio de Janeiro, os cinemas não eram mais adaptados, já estavam preparados para a exibição dos filmes, enquanto em São Paulo as exibições ainda eram feitas em casas adaptadas.
Aqui nós não temos uma casa para ser cinema, no máximo um cine teatro e aí surgem as dúvidas, vou ganhar dinheiro montando uma peça? fazendo um teatro de revista ou projetando um filme?, indaga — o historiador Máximo Barros no filme Quando as luzes das marquises se apagam(2018), de Renato Brandão.
O empresário Francisco Serrador cria, no centro do Rio de Janeiro, na década de 20, a primeira Cinelândia. São Paulo se inspira e cria a sua no começo dos anos 40. Tendo como marco a abertura do Cine Broadway , a Cinelândia cria um ponto de entretenimento no centro da cidade.
Na Cinelândia paulista, os cinemas possuíam um cronograma de lançamentos. Cada cinema do centro lançava um filme, eram praticamente de seis a sete filmes por semana e cada cinema tinha um dia certo de lançamento. O Art Palácio lançava filmes na segunda-feira, o Marabá, na quarta, o Ipiranga e o Metro lançavam as fitas na quinta e era dessa forma que as pessoas estavam acostumadas a ir ao centro para assistirem a lançamentos dos filmes.
Os cinemas chegavam a receber de 40 mil a 50 mil pessoas por semana. E aquelas salas inauguradas depois do Art Palácio competiam em elegância, conforto e em oferecer um som e uma projeção sempre melhores que os das salas anteriores. Era uma sala que tinha um preparamento acústico para um cinema e, assim, é lançado o cinema sonoro no Brasil.
Em estilo norte-americano, o Cine Metro possuía uma estética requintada, com toques de arte rococó. Ignácio de Loyola Brandão, romancista, define o Cine Metro:
As pessoas vinham do interior e diziam “você foi no cine metro? Você não foi no cine metro?” Era um sinal de que você não tinha vindo a um cinema em São Paulo. (BRANDÃO, 2018)
Para Máximo Barros, a grande novidade do Cine Metro era…
…eles colocarem do lado de fora, junto com o anúncio, por exemplo, de E o vento levou, o anúncio “Respire aqui o nosso ar puro” em qualquer época do ano. (BARROS, 2018)
As pessoas comemoravam datas festivas (aniversários/casamentos) no Cine Metro, os homens, de gravata, as mulheres, de colares de pérolas e roupas bem arrumadas. Ir ao Cine Metro era um dos programas mais chiques de São Paulo.
O documentário ainda aborda o nascimento de outros cinemas na Cinelândia paulistana, o Cine Marabá, que veio depois (1944), era espaçoso e possuía passagens largas entre as fileiras de poltronas. Com isso a capacidade do cinema (1.022 assentos) ficava menor, porque naquela época era antieconômico fazer um cinema com 1.500 lugares.
Senhoras dos Jardins que vinham em um bonde especial, todas arrumadas, assistiam à sessão das 14h no Cine Marabá, então paravam na livraria Jaraguá, ouviam um especialista sobre uma peça renomada que acabara de estrear em Paris, tomavam o chá das cinco e voltavam para suas casas. (BARROS, 2018)
Importante lembrar que naquele tempo ainda não existia uma sala de cinema na região sul da capital paulista. Na década de 40, ir ao cinema era um grande evento, programava-se o passeio, as pessoas se deslocavam para o centro e se reuniam com os amigos para desfrutar desse lazer, que ainda era novo no Brasil.
Tornou-se um ritual ir ao cinema, ver as grandes estreias, com refrigerante e pipoca, feita na hora, e conferir o lançamento do dia.
Com a entrada da televisão em 1950, todos sabem que o público sai das salas de cinema e se volta para a TV, que fica dentro de casa e você paga uma vez só. Portanto, só havia vantagens. Além disso, em 1969, havia 4.000 televisores em São Paulo e o cinema estava perdendo sua vez como o entretenimento dos paulistanos.
Assim, os icônicos cinemas da Cinelândia paulista perdem sua imponência e, aos poucos, durante os anos 80, vão deixando de existir para dar lugar a igrejas, entre outros espaços. As salas de cinema se deslocaram de vez para os shoppings center e o que antes era um ritual viram um passeio sem glamor.
Em entrevista ao LabJor FAAP em agosto de 2020, o historiador e professor de história do cinema Celso Sabadin explica sobre a mudança na experiência de frequentar as salas de cinema e como a pandemia pelo novo coronavírus influenciou hoje o costume de trocar as salas de cinema pelas plataformas de streaming.
Qual será o futuro da experiência cinematográfica? Ela se perderá em suas memórias ou será retomada por ser a única a proporcionar emoções em seus espectadores?
Celso Sabadin explica:
A experiência de ir ao cinema é positiva, pois se trata de uma atividade de lazer, além disso, existem filmes em que o tamanho da sala e a presença da tela escura são de extrema importância para gerar emoções nos espectadores.
Assim, com a ocorrência da pandemia do novo coronavírus, surge o questionamento: por que é importante ir a uma sala de cinema? O ritual tão conhecido por nós de sair para ver um filme em uma tela grande deixará de ser um programa de fim de semana? Ou iremos nos organizar e manter esse ritual vivo?
Está se perdendo por quê? A oferta do streaming é muito maior. Com a evolução das mídias, as diferenças entre cinema e streaming tem se tornado cada vez maior. E o espectador provavelmente está preferindo o streaming, afirma Sabadin.
O streaming não é a primeira ferramenta a tentar “alterar” a vida das salas de cinema ativas. Muito antes dele veio a televisão e depois dela as videolocadoras e, mesmo assim, o cinema de rua continua na ativa.
Na década de 70, as videolocadoras se multiplicaram em São Paulo. O surgimento das lojas de aluguel de filmes em São Paulo é o tema do documentário Cinemagia (2017), de Alan Oliveira, também exibido na última edição do festival É Tudo Verdade. Grandes e pequenas, no centro e nos bairros, elas atraíam de cinéfilos a curiosos. O documentário conta que a história começou com Adelino dos Santos Abreu, o Ghaba, criador da primeira videolocadora da cidade.
A cineasta Helena Cunha Bueno, amiga dele, diz que o cinema tinha “toda aquela magia, tela grande”, mas as pessoas também sentiam necessidade de levar filmes para casa. De maneira informal, os dois passaram a alugar filmes e exibir na sala da casa dela. Depois, em 1978, fundaram a Omni Vídeo, primeira videolocadora de São Paulo. É interessante observar que cada dono de locadora, desde as pequenas, de bairro, até as grandes e mais conhecidas, como a própria Omni e a 2001 Vídeo, diziam ter os mesmos sonhos: manter o cinema vivo e ganhar dinheiro. Isso ficou claro com a criação da rede Hobby Vídeo, que já nasceu grande.
Em 2015, essa história ganhou um de seus últimos capítulos com o fechamento da 2001 Vídeo. Seus proprietários alegaram que era “tempo dos jovens, das novas tecnologias”. Com o passar dos anos, as horas livres do cliente haviam diminuído. E a experiência de ter de escolher um título na loja, assistir a ele em casa e depois devolvê-lo foi perdendo sentido. A chegada das novas tecnologias também vitimou o contato humano, uma das características de uma ida à videolocadora.
Cinemagia é montado sem uma narrativa cronológica e guiado pelos depoimentos e pela própria história do cinema. No final, acaba remetendo a Quando as luzes das marquises se apagam. As duas histórias — dos cinemas do centro e das videolocadoras — acabaram afinal tendo fins parecidos.
Cinema contemporâneo
As salas de cinema foram temporariamente fechadas depois que a pandemia do novo coronavírus se instalou no mundo em 2019 e não há uma data para acabar. Esses espaços, que antes eram pontos de lazer garantidos de cidades como São Paulo, deixaram de ser frequentados pela população.
Sétima arte em tempos de pandemia
A pandemia do novo coronavírus foi um fenômeno que pegou toda a sociedade de surpresa. As pessoas de todos os lugares do mundo não esperavam por isso e quando aconteceu gerou prejuízo para todos. Um dos meios mais afetados foi o setor cultural, pois ir a salas de cinema e realizar produções de filmes e séries, entre outras artes foram interrompidas.
As salas de cinema deixam de ser locais de encontro para se tornar espaços a serem evitados pelo medo da contaminação. As pessoas estão sem sair de casa, com medo de andar na rua, de frequentar restaurantes, mesmo em ambientes abertos. As salas de cinema, diferenciadas por serem locais escuros, com pouca circulação de ar e com perigo de super-lotação, foram as primeiras a serem fechadas.
Para o cineasta e empresário André Sturm, dono do cinema Petra Belas Artes, no centro de São Paulo, o público, após a pandemia, voltará para as salas de cinema para ver gêneros de filmes específicos.
As pessoas não irão mais ao cinema para ver qualquer filme. Nisso eu concordo com você. Certo tipo de filme a pessoa vai preferir assistir de outro jeito. No mais, seja no mundo do cinema mais independente, como um filme do Tarantino ou um filme do Almodóvar, o filme que ganhou a Palma de Ouro em Cannes, esses, as pessoas vão querer ver no cinema. Grandes filmes com efeitos especiais, como “1917”, que você assistiu no começo do ano . Então, são esses filmes que fazem a diferença para levar o espectador ao cinema. (STURM, em entrevista por telefone em 28/08/2020)
Streaming
Com o surgimento do streaming, começa-se a questionar a experiência de ir ao cinema, considerado relevante para a vida cultural urbana e que sempre geraram renda até este momento. Cria-se a ideia de que o consumidor não precisa mais sair de casa para ver um bom filme. Do conforto do seu sofá, ele consegue ter uma experiência melhor ou igual à de uma sala de cinema.
Uma pesquisa realizada pela empresa Conecta, pertencente ao grupo Ibope, em 2015, constatou que um em cada três entrevistados (34%), já assistem a filmes e programas de TV por demanda pelo menos uma vez por semana. Vinte e nove por cento dos entrevistados ainda não utilizam esse tipo de serviço.
Ainda assim pode-se perceber que lá em 2015 o desenvolvimento dos serviços de streaming, principalmente a Netflix e a HBO GO, ativas na época, já atraíam muitos usuários no Brasil.
Embora muito tenha sido escrito sobre a perda de clientes da empresa nos EUA no segundo trimestre, devido a assinaturas mais caras, estimamos que o crescimento da audiência da Netflix na América Latina permanecerá forte. Prevemos que, neste ano, a audiência da Netflix na América Latina aumente em 26,4%, para 70,1 milhões de usuários. À medida que a empresa continua a oferecer mais conteúdo local, esperamos que esse número suba para 88,2 milhões até 2023, quando 13,4% dos indivíduos na região assistirão regularmente à Netflix. (CEURVELS, 2019)
Atualmente a adesão às plataformas de streaming, segundo o site Extra, na reportagem “Com pandemia e novos hábitos, 2020 se torna o ano do streaming no Brasil”, de 27/09/2020, as plataformas de streaming geraram entretenimento obrigatório, já que, por causa do isolamento social, as pessoas permaneceram dentro de casa. A reportagem ainda cita uma pesquisa feita pelo grupo Consumoteca, de 2020.
Para 51% dos brasileiros, o serviço de streaming entrou ou continuou na lista de prioridades de gastos durante a pandemia. A necessidade de ter mais entretenimento em casa antecipou o alcance de metas das plataformas audiovisuais — e fez com que 2020 se tornasse o ano do boom do streamingno Brasil. O Globoplay, por exemplo, registrou alta de 145% na base de assinantes no primeiro semestre de 2020, em relação ao mesmo período de 2019. (VELOSO e TONDO, 2020)
Assim, baseando-se em opiniões e dados, conclui-se que os públicos têm deixado de ir ao cinema por encontrarem nas plataformas de streaminguma forma de lazer mais barata e com uma gama de opções mais diversificada.
Mesmo assim, a experiência de ir ao cinema é repetível porque ela nunca deixará de existir, apenas será adaptada aos novos tempos. As salas de cinema no futuro serão utilizadas por um público de nicho, como, por exemplo, em lançamentos de grandes produções, ou estreias de filmes com super-heróis que nasceram nas histórias em quadrinhos, como o próximo filme do Batman, The Batman, de Matt Reeves, previsto para ser lançado em 2022.
Nem com o aparecimento de locadoras nem com a vinda da televisão as salas de cinema desapareceram. Elas atraem seus clientes com outros recursos, como salas VIP, locações das salas para eventos e reuniões, além da exibição de outros tipos de conteúdo, como jogos de futebol e futebol americano (Champignons League e do Super Bowl), exibição de óperas e shows de rock.
Cinema X streaming
Segundo pesquisa realizada pela empresa de consultoria Ampere Analysis em 2019, a receita global de assinaturas de plataformas de streaming, a Netflix e a Amazon Prime, deve ser maior do que a bilheteria mundial de cinemas em 2019. De acordo com a empresa o aumento deve ser de 15%.
Deve-se levar em conta que o preço do ingresso faz com que as pessoas prefiram utilizar-se de plataformas de streaming para ver filmes a ir ao cinema. Além da comodidade de ver um bom filme, de boa qualidade, em sua própria casa. Acrescentado o fato de que, quanto mais caros os ingressos de cinema, menos vezes o público comparece às salas e vice-versa.
As produções cinematográficas viram nas plataformas de streaming uma maior aceitação. Sendo assim, percebe-se que a adesão às plataformas de streaming tem feito as pessoas abandonarem as salas de cinema, já que enxergam nas produções modelos mais “baratos” de acesso ao cinema.
O sucesso do filme Tenet ( 2020) é um fato que prova a tese de que, mesmo com a escolha por uma plataforma de streaming, os consumidores, não deixarão de frequentar as salas de cinema. O que irá mudar, e isso de forma mais acelerada por conta da pandemia, serão as escolhas de quando frequentá-las. Também porque ao verificar o número de ingressos vendidos em uma semana no Brasil, constata-se que Tenet foi um sucesso de bilheteria, faturando mais de R$1 milhão em sua semana de estreia.
Festivais de cinema online
Em tempos de isolamento social, festivais de cinema conectam os amantes da sétima arte aos filmes por meio de plataformas de streaming eficientes que, sem sair do sofá, transportam os espectadores para dentro dos filmes.
A cineasta e presidente da SPcine, Laís Bodanzky, disse que os festivais de cinema são o pulmão do audiovisual. (Essa declaração foi feita durante a coletiva de imprensa do festival É Tudo Verdade, em 22/03/2020)
O mundo em 2021 continua diferente. O que existia até 2019 não faz sentido em 2020 nem em 2021. As prioridades mudaram, o instinto de sobrevivência agora fala mais alto do que tudo. As relações sociais foram fisicamente interrompidas e como era de se esperar a cultura foi a área que mais sofreu.
Com a impossibilidade de frequentar salas de cinema, as pessoas têm buscado o contato e a convivência em debates sobre seus filmes preferidos. Eles agora se dão somente em lives e videochamadas.
A experiência de ir ao cinema mudou. Não acontece mais vivenciar a sala escura durante três horas, o consumidor aprecia o filme sentado no sofá de casa.
A implementação dos festivais de cinema online vem para dar um respiro àqueles que sentem falta de compartilhar os sentimentos em relação ao filme assistido e, assim, dividir suas opiniões por meio de debates virtuais após a exibição dos filmes.
Festivais de cinema são os locais onde cineastas, produtores, exibidores, atores, críticos e o público se reúnem para apreciar e discutir a arte cinematográfica. Nos últimos tempos, festivais como os de Veneza e de Toronto remodelaram suas programações e adaptaram o conteúdo à plataforma online.
Enquanto isso, o festival de Cannes entendeu que não era certo manter sua programação em um formato que não fosse o presencial, com a ausência do público apreciando os filmes da maneira tradicional, ou seja, em uma sala escura, reproduzidos em uma tela preta com o som abrangendo todo o ambiente.
Além disso, o diretor do festival, Thierry Frémaux, em entrevista à revistaVariety, em abril de 2020, demonstrou preocupação em relação aos direitos autorais dos filmes que seriam digitalmente exibidos.
Isso porque os festivais online estão ganhando forma ao redor do mundo. O festival de documentários É Tudo Verdade , em sua segunda parte, trouxe em 2020 uma sessão de debates online após a exibição dos filmes, promovendo a sensação que tínhamos ao frequentar uma sala de cinema.
Os eventos presenciais com o cinema serão dificilmente substituídos depois que a pandemia acabar. Provavelmente as pessoas vão querer voltar a ter a experiência de frequentar os festivais, de ver os filmes em tela grande e de discutir sobre eles durante um café, um almoço ou na saída da sessão.
Para a cineasta e diretora da Mostra Internacional de Cinema em São Paulo, Renata de Almeida, produzir e realizar esse festival pela primeira vez de forma virtual foi uma novidade.
Ela afirma em entrevista ao LabJor, no dia 27/08/2020:
O que a pandemia causou foi que todos os processos que já estavam sendo desenvolvidos se aceleraram. A gente fez a primeira mostra online do mundo [Ela se refere ao projeto com a antiga plataforma The Authors, atual MUBI] Havia vinte filmes online sendo exibidos. A gente chegou a fazer por dois anos, 2008 e 2009. Mas em 2009 foi um fracasso, porque ninguém tinha o costume de ver online. Espero que alguns filmes sejam lançados e, se a pessoa achar que tem de ver esse filme em tela grande, ela vai rever o filme.
Sendo assim, é provável que o cinema ainda existirá por muito tempo. Isso porque ir ao cinema, atualmente, não remete somente a ver um filme, se refere também a frequentar festivais de cinema, principal modalidade que atrai os públicos às salas de cinema em todo o mundo. Mesmo sendo mais em conta ficar em casa, a experiência de ir ao cinema nunca acabará. Os cinemas contarão com o público em suas salas. O ritual de frequentar uma sala de cinema não é um hábito fácil de ser esquecido.