Às vezes a empresa faz besteira; às vezes a sociedade tem reações distintas daquela que a empresa desejava/esperava; e, às vezes, só dá ruim mesmo…
No desenvolvimento de campanhas de comunicação, considerando o momento de revisão de valores e daquilo que é considerado apropriado (não querendo usar o termo “correto”), faz-se cada vez mais necessários nas empresas o “Departamento de Vai (ou pode) dar m****”.
Aquela pessoa com pouco apreço a políticas corporativas que levanta a mão no meio da reunião e questiona, com a testa franzida: “Mas, gente, será que….”.
Ao longo da história diversas campanhas publicitárias – por imperícia, imprudência ou desalinhamento com cosmovisões sociais vigentes – acabaram por transformar o ousado em rechaço.
E, quando a m**** acontece, limpa-se o ventilador? Arrasta pra debaixo do tapete? Ou assume o “Foi mal, galera, intolerância à lactose aqui! 🙋🏻♂️”?
Falamos do gerenciamento de crises de comunicação, quando uma mensagem, frase, slogan ou posicionamento tortos (ou entortados pela sociedade ou parte relevante e/ou ruidosa dela) transformam aquela campanha (que a agência pensou ser engraçadinha) em um problema de imagem de marca.
Aproveitando o período pós-carnavalesco, alguém se lembra do “Esqueci o não em casa” de 2015? O Conar deixou passar, mas o público não….
E quando o tio Ronald resolveu homenagear as mulheres em seu Dia Internacional dando folga…. pros homens?!
“É grande e não cabe na minha boca”, e a piada de tiozão
Mais recentemente, dois casos alimentaram os posts de Linkedin as discussões no meio publicitário: analogias sexuais ao tamanho de um sanduiche e uma piada tiozão-do-pavê no naming rights de um estádio de futebol.
Deixando o Kid Bengala pra trás um pouco (não, pera… desculpa), pra quem estava de férias nos últimos meses, a Mondelez, dona do chocolate BIS (que é impossível comer um só – este não é um post patrocinado, mas poderia), adquiriu os direitos de propriedade de nome do Estádio do Morumbi, em São Paulo, renomeando-o para MORUMBIS…. (pausa)
(/pausa)… gerando reações não tão positivas nas redes sociais – e não apenas entre sãopaulinos.
Enfim, uma crise… o que fazer?
A literatura acadêmica sobre gerenciamento de crises traz um conjunto de técnicas de análise (rápida) sobre o tamanho da m**** para adotar alguns caminhos possíveis em seu contorno. E, ora ora, pedir desculpas nem sempre é o caminho mais apropriado.
Quem se desculpa, assume a culpa (dolosa ou culposa), assume um erro que nem sempre é um erro, às vezes pode ser um vacilo, às vezes pode ser uma discordância… enfim, sempre (SEMPRE) haverá críticas para qualquer coisa nas redes sociais.
Por exemplo, isto é um graveto:
- – Não! É um pedaço de pau!
- – Isso é um símbolo fálico impróprio para as famílias!
- – Uma árvore caiu em cima do meu pai e ele morreu! Deu gatilho! Estou ofendido!
Então…
Assumir uma culpa (independente do grau do problema), significa adicionar uma notação em seu boletim de imagem de marca; um rabisquinho permanente de vacilo que será relembrado a cada oportunidade – como minha cachorra que latiu UMA VEZ para a senhora do 5º. andar e agora sofre olhares desconfiados do porteiro da tarde…
Lidando com crises
Diz-se no gerenciamento de crises que a melhor forma de lidar com uma crise é evitar que ela aconteça. Mas, no mundo real, crises reais são inesperadas, por mais que façamos um belo gerenciamento de risco ou reduzamos o potencial da sociedade deturpar intenções, a princípio, inocentes da sala de reunião.
Na impossibilidade de uma vida sem crise de imagem – e uma vez que você já virou textão nas redes sociais – o objetivo será sempre evitar que a crise evolua.
Diferente dos Pokemons, no gerenciamento de crises seu objetivo é evitar que a crise evolua.
- – Tá, desculpa!
William Benoit (da Universidade de Alabama) e Timothy Coombs (da Texas A&M University) são dois pesquisadores que, há anos, exploram alguns dos caminhos mais utilizados em gestão de crises de imagem. A opção por uma ou outra estratégia dependerá de um conjunto de variáveis que agravam ou atenuam a situação – como, por exemplo, impacto real nas pessoas afetadas, extensão do fato, natureza da crise em si, entre outras.
Incluindo alguns outros autores e buscando sumarizar potenciais abordagens (de forma lúdica e com ícones bonitinhos):
Dependendo destas variáveis, a empresa pode adotar, então, diferentes estratégias, cada uma com seus prós, contras e riscos.
Como estudioso da retórica e das histórias, uma das técnicas que me chama a atenção é uma formalizada por um grupo de pesquisadores chineses (Kim, Zhang e Zhang, 2016), o self-mocking!
Ou, em uma tradução livre para um termo que achei divertido: a auto-tiração-de-sarro!
Fazendo breve uma longa história, no self-mocking não se ignora que houve um erro ou uma discordância; contudo, entende-se que este erro não gerou ofensas e pode ser facilmente interpretado como um lapso (por exemplo, um erro de digitação) ou divergência de opinião.
Ao tirar sarro de si mesma e/ou da situação, a marca reduz a importância do fato sem ignorá-lo. “Ok, erramos ou discordamos, mas, calma jovem, isso não é uma ofensa aos seus antepassados!”.
Alguns casos interessantes do uso do self-mocking para lidar com lapsos ou divergências de opiniões:
“A tacada de Jesus”
No game PGA Tour 2008, um jogo de golfe produzido pela Electronic Arts com Tiger Woods, o único golfista do mundo (fala o nome de outro!) recebeu críticas de um, então, famoso youtuber ao ser descoberto um erro (bug) no jogo que permitia com que o jogador caminhasse e fizesse tacadas sobre as águas, o que foi apelidado de Jesus Shot (algo como ‘a tacada de jesus’).
Era verdade? Sim! Foi um bug… Mas como a Electronic Arts respondeu ao ocorrido:
Quem tem céu, tem medo
Um dia, em 2017, ficou nublado no Rio de Janeiro. Aparentemente até em lugares onde o sol não bate.
A culpa é do estagiário chefe
Aparentemente, após um e-mail da equipe de social listening, pessoal da Mondelez resolveu tratar o caso Morumbis com a mesma interpretação do público: p**** trocadilho infame!
Baixou a tensão, traz humor, aceita a visão do público e… bola pra frente.
Mantenho um arquivo extenso de casos de crises de imagem nas redes sociais e o capítulo do self mocking tem um espaço especial no meu coração. Quem quiser contribuir, manda seu causo nos comentários….
E, sobre o caso da Mondelez, achei o pessoal habislidoso (ah, para!).