Num sábado comum, uma equipe prepara a filmagem de um comercial de perfume no Edifício das Américas, no centro de São Paulo. O prédio, que já foi um símbolo de prestígio, agora é habitado por uma classe muito menos favorecida.
“Sábado”, do diretor Ugo Giorgetti, parte de uma colisão entre esses tipos. Magda Bloom (Maria Padilha), diretora de arte da equipe, fica presa no elevador com Belo (André Ambujanra) e dois funcionários do IML (Otávio Augusto e Tom Zé, numa hilária participação) que foram buscar um corpo. Enquanto o comercial é gravado, um colega de Magda busca ajuda pra desprendê-la.
Os personagens são teatrais, caricatos, mas também releituras muito irônicas dessas pessoas que vivem nos dois extremos: a classe baixa e as pessoas que acham que não fazem parte dela.
Também roteirista, Giogertti tira da publicidade a matéria-prima pra tratar a nossa ilusão patológica com a cultura europeia e a negação da identidade brasileira.
Por exemplos, dois atores brancos vestidos como nobres em um castelo, usam um hall de um prédio decrépito como cenário, enquanto os moradores – desempregados, vendedores, prostitutas – aguardam.
É fácil pesar a mão. Mas há um cuidado para não deixar o tom farsesco manchar o teor dramático do filme e manter seu conteúdo tristemente atemporal.
Quando o elevador quebra, lá do térreo dois homens de terno se ajoelham e pedem que “Jesus arrume”.
Na melhor cena do filme, o zelador vai até a casa do velho morto – que já fora devidamente saqueada – e encontra uma farda militar e diversos documentos e fotos nazistas. A mulher do zelador o encontra, força o marido a usar a farda para “parecer mais apresentável” na hora de pedir cachê para a equipe, e atira pela janela o restante do arquivo.
A luta de classes está lá, mas o maior foco do filme talvez seja a depredação da cultura brasileira através do edifício das Américas. Ele não é só um construção, é um símbolo imaginário dos nossos desejos.
Se em “Sonho Tcheco”, o falso documentário que mostra como a ilusão de um novo supermercado concentrou toda a decepção de um país sobre o novo sistema econômico da União Europeia, em “Sábado” a gente vê essa depreciação social multifacetada, como é a cultura brasileira.
Na “Noite Americana” de Giogertti, a Publicidade não é um instrumento de alienação da realidade, ela tem vida própria e não se mistura com os brasileiros que veem os anúncios na televisão. Esses dois brasis se interrogam e se espelham, embora a conclusão seja direta: no estouro da bolha cultural, a publicidade nada mais é do que falar da importância da irrelevância.