Vamos falar um pouco sobre aquilo que move o mundo: o amor dinheiro.
Por mais puritano, utopista e ‘kumbalaia’ que alguém possa ser, não há como negar que o dinheiro traz, sim, felicidade, e nada até hoje me convenceu do contrário. Quer dizer, não o dinheiro em si, mas a tranquilidade que ele proporciona enquanto você vai atrás de usar seu tempo com algo que te deixe feliz.
E, sendo assim tão relevante no mundo em que vivemos, não é de se surpreender que revoluções ocorrem mais rapidamente quando se nota que é possível gerar mais riqueza ao adotar novas tecnologias e novos comportamentos.
O capítulo de hoje na reflexão sobre a digitalização da vida, então, trata da gestão financeira em ferramentas digitais, onde estão incluídas as Fintechs, cuja melhor definição que vi para o termo foi do Marc Berry Reid (COO da agência Way to Blue):
Fintechs são startups com abordagens disruptivas que querem fazer com o mercado financeiro o que o Uber fez com os táxis.
Olha a galera que está nessa brincadeira… Este link traz uma reportagem bem bacana sobre algumas Fintechs
Embora o tema vá além destas novas empresas, para entender o quanto as Fintechs quebram um modelo “tradicional” de gestão de valores, temos que refletir sobre o quanto fomos (e somos) ludibriados pelo sistema bancário.
Vem pro banco você também, vem! #sqn
Não indo muito longe na história, vemos uma mudança de pensamento dos nossos bisavós/avós para hoje. Uma vez aceito que aquele pedaço de papel (dinheiro) tinha valor, nossos bisavós/avós queriam proteger esse valor mantendo-o próximo, por isso as velhas histórias de ‘guardar dinheiro no colchão’. Nossos pais/avós, porém, perceberam que ele ficaria mais “seguro” se estivesse em algum lugar cheio de guardas e aí começamos a bancarizar o sistema monetário.
Ao também perceberem que o dinheiro perde valor ao longo do tempo (depreciação/inflação), custaram um tempo a entender que o rendimento da poupança não estava “dando dinheiro” pra eles, mas sim compensando, porcamente, esta desvalorização. No Brasil, especificamente, os tempos de hiperinflação praticamente criaram uma dependência do sistema bancário para proteção do valor do dinheiro; o salário era um bloco de gelo na sua mão, que ia derretendo até você guardá-lo no banco e tentar evitar sua estrondosa depreciação.
Os bancos tornaram-se, então, mamutes corporativos, impressionantemente robustos em vários sentidos (quem tiver a chance de visitar a sede do Bradesco, em Osasco, ou o complexo de prédios do Itaú, na região da Conceição, em São Paulo, não perca essa oportunidade; é impressionante).
O banco (foi) feito para mim?
Mas essa grandiosidade, como em muitos casos, teve como consequências negativas o engessamento dos processos e o distanciamento do pensamento voltado ao cliente.
A transparência e suporte nas decisões diárias para com o cliente é tão ruim nas instituições bancárias tradicionais que deu margem ao surgimento de “intermediários de informação” como, por exemplo, o Guia Bolso, no Brasil, a Mondo, no Reino Unido – apps que consolidam as informações financeiras e de cartões de crédito em um mesmo local, além de ajudar no planejamento e acompanhamento das despesas mensais -, ele faz o que os bancos deixaram de fazer: ajudar o cliente a gerenciar seu próprio dinheiro.
Na verdade, o problema dos grandes bancos é o mesmo das outras grandes empresas: tornaram-se transatlânticos com centenas de capitães, onde, para desviar de um iceberg, levam 1 ano.
Muita gente para “decidir” (e a maior parte delas lutando para não mudar o modelo com o qual já se acostumaram a trabalhar depois de décadas, refletindo o perfil dos funcionários). Isso os impede de confrontar elementos do status quo. O primeiro deles: ganhar dinheiro junto com os clientes e não usando-os como matéria-prima para recursos de capital.
Aí veio a internet!
O Internet banking foi uma revolução no atendimento, não no modelo financeiro. Ele automatizou processos que antes fazíamos na boca do caixa ou com o gerente. Claro que isso implicou em uma menor necessidade de bancários, agilizando os comandos; mas, fundamentalmente o que o internet banking fez (e, nos bancos tradicionais, faz) foi transferir para o monitor o que você fazia, antes, com uma interface humana.
As Fintechs não fazem isso; tampouco seu negócio principal é montar uma app bonitinha; a razão de sua existência é questionar o modelo de relação entre fornecedor e cliente, simplificando-o, deixando mais transparente e ganhando junto com o cliente.
Em todo o mundo, o mercado financeiro é extremamente regulado e o pulo do gato destas Fintechs é ter pessoas que conhecem e respeitam as regras mas não se submetem a burocracias e processos desnecessários. É quando o “é assim que sempre fizemos” perde.
O Paypal inovou ao popularizar o conceito de e-wallet, que, no fundo, é um lugar onde você deposita seu dinheiro pra passar pra outros (tipo assim, um banco?). O que todas carteiras virtuais (Uol PagSeguro, Bcash, etc) querem é que você deixe seu dinheiro lá para eles o investirem e ganharem com isso. Estão usando seu capital para gerar renda pra eles.
E esta fragmentação é vista também em ‘empresas não financeiras’. Ao permitir o carregamento de dinheiro em seu aplicativo, o Starbucks não está tornando a vida de seu consumidor mais simples (permitindo pagar “pela app”), mas sim tornando-se um captador de recursos financeiros (e usando isso para investir e ganhar dinheiro não só vendendo cafés com nome próprio, mas com o seu capital).
– Macchiato-espresso-frapuccino-give-me-your-money-latte grandi pra viagem, senhor?
Dá pra (quase) todo mundo ganhar dinheiro junto
Finalmente chegamos àqueles que corrompem este universo de verdade…
O amor criado pelo cartão de crédito roxinho que não cobra anuidade e ainda tem um atendimento “gente fina” é a resposta imediata ao descaso do modelo tradicional de cartões de crédito.
Se estamos aceitando mais facilmente trocar valores em bits e bytes (ecommerce), usar e-wallets (Paypal, Pagseguro, até o Starbucks), cartões de crédito gerenciados via app – que, aliás, só tem um cartão físico porque ainda não há estrutura para virtualizar a operação (Nubank) e corretoras de investimento/homebroker virtuais, chegará o momento em que questionaremos a simples custódia do dinheiro? Por exemplo, o Banco Original, outra startup brasileira, busca desburocratizar e, através da conectividade, dar a transparência necessária na relação banco-cliente. O mineiro Intermedium é outra opção para quem já consegue desvincular “instituição financeira” de “banco”.
E as Fintechs tendem a revolucionar a gestão do dinheiro como o e-commerce modificou as relações comerciais a partir de 1999.
Paralelo a isso, na verdade, o crowdfunding já impactou consideravelmente a troca de valores entre indivíduos e empresas. Para as empresas, a vantagem de fugir de empréstimos bancários (e dos juros); para os consumidores, além de buscar “uma melhora coletiva” (o que poderia ser visto como o último nível de uma versão digital da pirâmide de Maslow, “a ajuda coletiva para um bem maior”), a possibilidade de ser o primeiro a adquirir um produto inovador e/ou desejado. Cada vez menos, novamente, bancos são necessários na relação entre troca de valores.
A gente não quer só comida; a gente quer comida e rentabilidade que se reparte
Desde que o dinheiro deixou de ser encarado como algo físico (notas, moedas) e passou majoritariamente a circular através de bits e bytes, em transações eletrônicas, ele passou a contar com diversos benefícios catalisados pelo mundo digital: transparência, agilidade, amigabilidade, humanidade. Falta às grandes instituições descobrirem como incorporarem isso além de sua publicidade, quer dizer, eliminar décadas e décadas de processos burocráticos em prol de uma maior proximidade com o cliente, efetivo dono do dinheiro e que, aos poucos, vem fragmentando a distribuição de sua riqueza entre múltiplas carteiras e serviços de empresas distintas, buscando maiores ganhos e menos preocupações.
Não queremos mais tomar cafezinho com o gerente, queremos alguém que nos ajude a facilitar nossa vida e ganhar mais dinheiro (se, nesse processo, eles também ganharem, ótimo! Mais que justo). As Fintechs já sabiam disso, e estão descobrindo como faze-lo em um dos mais regulados, burocráticos e, até então, engessados mercados do mundo.
Já dizia o poeta Falcão, “dinheiro não é tudo, mas é 100%”.