Branded content: menos interrupção, mais colaboração

Branded content: menos interrupção, mais colaboração Branded content: menos interrupção, mais colaboração

Diante da enormidade de gurus, embaixatrizes e outros experts instantâneos que nascem junto com novas terminologias, o branded content vem felizmente (e finalmente) se consolidando no Brasil como ferramenta fundamental de comunicação. Por definição, é simples: conteúdo relevante para o usuário, viabilizado por uma marca em troca de sua divulgação de forma menos intrusiva e mais pertinente.

O branded content bem feito é aquele em que você curte (literalmente) o conteúdo consumido, compartilha, revê e não se incomoda em perceber que tem uma marca ali no meio – porque se você perceber demais, não fez sentido; e se não perceber, ele falhou miseravelmente. Ele não vem para substituir a publicidade, muito menos o entretenimento, mas une ambos de uma forma que indiscutivelmente chama atenção das duas indústrias.

Nesta segunda (22) e terça-feira (23), a Apro (Associação Brasileira da Produção de Obras Audiovisuais) realiza em São Paulo o Whext, evento que visa discutir o presente e futuro da produção publicitária. E além de assuntos como realidade virtual e a presença da mulher na indústria, o assunto permeou diversas discussões, entre elas um painel só para si: “Branded content? Publicidade tradicional? Digital? What’s next?”.

Branded content: menos interrupção, mais colaboração
A mediadora Renata Brandão (Conspiração Filmes) com Flávia, Moliterno, Páscoa e Rizuto

“Temos que parar de interromper para entreter”, destacou Rafael Rizuto, diretor-executivo de criação da agência 180, de Los Angeles, fazendo uma curiosa análise baseada no consumo de conteúdo atual: “O maior concorrente da Netflix hoje, por exemplo, é o sono”. Rizuto, que passou por grandes agências do Brasil e do exterior, participou de grandes cases recentes baseados no conteúdo para divulgar marcas que vêm surfando muito bem nessa onda, como Coca-Cola e Airbnb, e destaca que sua melhor receita atual para o sucesso da estratégia é a colaboração. “Temos que sair do casulo das agências e trabalhar de forma mais colaborativa, ter um relacionamento mais emocional que apenas oferecer um serviço de hora-homem, tratar os fornecedores como parceiros de verdade. Senão, seremos da vez mais apenas um intermediário”.

Um dos exemplos citados pelo criativo (e um trabalho sensacional, ganhador do Grand Prix for Good no Cannes Lions 2016) é “Unfairy Tales”, da própria 180LA para Unicef. Eles transformaram histórias de crianças sírias refugiadas em contos de fada – não necessariamente com final feliz, em diversos filmetes de animação. Conteúdo na essência, marca e propósito por trás (veja o case abaixo e assista a um dos filmes aqui, já traduzido):

Melhorar a relação entre os envolvidos – agências, anunciantes, produtoras e mídia, principalmente – é também o que falta na opinião de Marcelo Páscoa, diretor global de criação da Coca-Cola. O executivo destacou que sai na frente por cuidar de uma marca que faz parte da cultura popular mundialmente, mas que isso está longe de ser garantia de sucesso. “Nós criativos, especialmente no Brasil, somos muito inteligentes. Mas isso às vezes atrapalha um pouco. De vez em quando, falta humildade para sentar, conversar com nossos pares e desenvolver algo em conjunto, mais que o ‘nosso projeto’. Não devemos perder tempo com as coisas que a gente não acredita, mas não vamos também dedicar tanto tempo assim para aquilo que só a gente quer fazer”, enfatizou.

Como exemplo de um case de extremo sucesso por um lado, mas fracasso por outro, Páscoa citou o case “Happiness factory”, criado pela Wieden+Kennedy Amsterdã e vencedor de diversos prêmios em 2007. Um dos primeiros grandes cases do então recém-nascido branded content, ele ganhou o mundo na TV, na internet e nos festivais, mas morreu cedo demais. “Eu ouvi a história completa do desenvolvimento desse trabalho. Cada personagem tinha sua própria história, sua inspiração e seu propósito. Era um trabalho muito complexo, mas morreu cedo demais. Havia muito ainda para se explorar por lá, mas isso não foi feito – provavelmente porque trocaram o diretor de marketing, ou algo assim. Era um ‘projeto de outra pessoa’. Isso não pode acontecer”, reforçou.

Retrato de um novo movimento, com as consultorias investindo em grandes criativos oriundos de agências, Eco Moliterno também deu sua visão sobre o tema. Ex-líder criativo de grandes agências, como Africa e Y&R, e atualmente chief creative officer da Accenture Interactive, ele traçou uma linha intitulada “From sell to tell” (“Da venda ao ‘contar’”, em tradução livre), que partia do varejo tradicional, passando por merchandising, propaganda, adverteinment, branded content e product placement, até o entretenimento puro.

“O ‘antigo’ não morre. Essas disciplinas não se canibalizam e continuarão coexistindo durante muito tempo. Mas é inegável que estamos indo cada vez mais para a direita. As pessoas não compram mais apenas produtos, mas também suas histórias. As duas coisas são fundamentais hoje”, pontuou, dando, entre outros exemplos, o de “Beauty inside”, da Pereira & O’Dell para Intel + Toshiba: uma das primeiras webséries tecnicamente independente como entretenimento, com uma presença sutil, porém marcante, dos anunciantes que viabilizaram o projeto financeiramente. Tudo isso nascido dentro de uma agência – e vencedor não só de Grand Prix em Cannes, mas também de um Emmy.

Olhando mais com a visão de tecnologia e futuro, Flávia Verginelli, managing director de produtos e inovação do Google, ressaltou como as ferramentas tecnológicas serão um novo meio para a viabilização dos projetos criativos. Porém, como sempre aconteceu em qualquer mídia ou plataforma, é a qualidade e pertinência do conteúdo que garantirá o sucesso de qualquer projeto de comunicação.

“Apesar dos avanços tecnológicos, simplicidade, conveniência e imediatismo são palavras-chave que continuam fundamentais. Não importa se o conteúdo tem um segundo ou uma hora, mas sim se ele é relevante”, conceituou, citando que o trabalho do Google – que já está migrando de “mobile first” para “artificial inteligence first” é desenvolver e oferecer plataformas para isso, das mais tradicionais, como já pode ser considerado o YouTube, como o mais recente lançamento “Google Lens”, onde é possível apenas apontar seu celular para uma flor, por exemplo, e descobrir seu nome e origem, ou para a fachada de um restaurante para checar seu menu e as resenhas feitas pela web.

https://www.youtube.com/watch?v=c1MylSgFaM0

Eco Moliterno fez uma feliz analogia ao final de sua apresentação, trazendo uma bagagem histórica para falar do atual momento do branded content: “É como o mecenato de antigamente. Os reis procuravam os artistas para criarem trabalhos. Eram eles que financiavam as grandes obras artísticas. Hoje, as marcas são os reis”. E a pergunta que fica é: você está pronto para ser Michelangelo, ou vai só aquele ajudante que coloca mais tinta na paleta?

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