O sci-fi (ficção científica) tem sido um meio artístico para muitos escritores ao longo dos anos para transmitir sua própria visão do futuro. Às vezes, eles consistem em configurações utópicas (por exemplo, Star Trek), das quais nos inspiram a transformar essas visões em aplicações práticas. Mais frequentemente, no entanto, a ficção científica geralmente transmite tramas distópicas, das quais servem como um aviso sobre possíveis futuros.
Por motivos culturais e sociais, a maior parte da ficção científica tem a tendência de ser centrada no Ocidente e, portanto, tende a ignorar várias culturas diferentes e seu passado se adere a um determinado grupo demográfico apenas. Lembre-se de que a grande maioria dos autores de ficção científica são homens, ocidentais ao norte do mapa. E como alguém que gosta de ler ficção científica (especialmente ficção distópica), acho um pouco difícil pensar em cenários gigantes distópicos – e evolutivos – enquanto opera sob um filtro politicamente e socialmente atual.
Sempre que um cenário distópico é escrito, geralmente envolve um cenário totalitário, onde os direitos da população em geral são limitados, se não totalmente eliminados.
O problema com essa atitude geral, no entanto, está no pressuposto de que esses cenários distópicos são deixados para a possibilidade de nosso futuro, e não para os de nossos dias passados ou presentes. É difícil para muita ficção científica distópica ressoar com dados demográficos fora daqueles que as escrevem, uma vez que ignora as realidades distópicas de outros grupos. Quase que regra, acaba-se caindo nos seguintes momentos:
- Forçado a um comércio internacional de escravos
- Genocídio em massa em escala nacional
- Submetido a campos de internamento ou extermínio
- Sob vigilância constante e aterrorizado pela polícia
- Ser tratado como objeto de teste por cientistas ou aliens
- E assim por diante…
Na realidade, o sci-fi distópico tem sido em grande parte a fantasia de um só grupo de padrão de pessoas de como será o futuro – de acordo com a visão, passado, e potencial futuro “deles”. Para todos os outros, no entanto, eles são apenas reformulados, secundários, e às vezes diluídos, histórias do que realmente algo direto que aconteceu com eles no passado ou no presente.
O que nos leva a outra forma de sci-fi, que está já tem terreno significativo de relevância, cada ano mais, expandindo de popularidade: o afrofuturismo.
Se queremos ser criativos e integrar melhor comunicação pensando no ponto maior de instigar e fazer uma troca com o público, precisamos aprender a ler, ouvir e entender a história de fora do que é considerado ‘salvo’ ou ‘normativo’. O CEO da Disney, Bob Iger, citou muito em suas entrevistas atuais, durante o lançamento de seu livro, o ponto crítico de fazer Black Panther, O filme afrofuturista da geração, feito por uma empresa que já devia, ha muito tempo, e continua devendo muito ainda, fazer exemplos e explorar histórias nunca antes pesquisadas, exploradas e que estão prontinhas para serem compartilhadas. A principal critica que ele enfrentou? “Não terá audiência”, “não terá vendas”, “o público para este filme não vai ao cinema só por causa da temática”, e tudo isto vindo direto da sua própria criadora, MARVEL.
Black Panther, de Ryan Coogler, no US, contabilizou na sua estreia 37% da audiência Afro-Americana, 35% Caucasianos, 18% Hispânicos e 5% Descendência Asiática. Para quem segue a industria, percebeu o que consideraram um sucesso e uma anomalia. Descobriram que existe a audiência, mas não o conteúdo. Para comparação, “US“, de Jodan Peele, levou 35% de Caucasianos, 32% de Afro-americanos, 22% Hispânicos e 7% Descendência Asiática. Contabilizando nos últimos anos, “Get Out“, “US” e “Black Panther“, foram os únicos que conseguiram levar o grupo demográfico esperado para cada um dos filmes. Sendo apenas um desses três, afrofuturista, que arrecadou o 3x o equivalente somado dos outros dois, 1.344 bilhões de USD nas bilheterias mundiais, #WakandaForever.
Conforme compartilhado pela autora de ficção científica Nnedi Okorafor durante sua palestra no TED, o subgênero Afrofuturism se diferencia da maioria dos outros contos de ficção, enfatizando fortemente as raízes culturais da herança africana. Igualmente, eles transmitem histórias das quais tentam abordar problemas passados ou atuais que ressoam diretamente com sua comunidade e suas lutas.
“Nem toda ficção científica tem a mesma linhagem ancestral”, observa Okorafor, “essa linha sendo ficção científica de raiz ocidental, que é principalmente branca e masculina.”
De fato, embora extremamente popular pela maioria dos padrões ocidentais, o conto de ficção científica comum nunca poderia ressoar com um público não ocidental, uma vez que ignoraram a cultura e a história desse público.
O afrofuturismo não é apenas um lançamento de foguete imaginativo para um futuro melhor, é também um portal para o passado e um espelho que reflete nossos dias atuais. Ele não tenta criar utopia assustando pessoas com distopias especulativas futuras; ao contrário, oferece uma estrutura para um amanhã melhor, expondo seus leitores a uma dura (embora sóbria) reintrodução de nosso passado distópico.
Mais importante, a história apresenta aos leitores um mundo totalmente novo, composto de cultura, idioma, moda e maneira de pensar. A ficção científica tem um longo histórico de exclusão daqueles que não se encaixavam no modelo centralizado no Ocidente e sofreu por causa disso. Por ser mais inclusivo, envolve mais e mais leitores em todo o mundo a começar a visualizar o futuro – o futuro deles, e integrado de todos nós!
No Brasil, já temos um trabalho de longo tempo e continua ganhando forte incentivo de trabalho na área, especialmente com o recém-lançado “Todo Mundo tem uma Primeira Vez“, da Plataforma 21. Uma coletânea de seis visões diferentes, e autores, que passam pelos gêneros ficção, fantasia urbana e distopia, e prometem abrir as portas para uma nova visão sci-fi futurista brasileira.
E debates que prometem compartilhar sempre mais sobre o assunto:
Além de um mercado que merece ser celebrado e explorado por todos nós:
Chegando até aqui, percebeu que o assunto é extenso tanto quanto as possibilidades de desenvolvimento de trabalho e, encontro da necessidade com a possibilidade de expandir o nosso próprio universo – dentro de nossas mentes – conseguiremos ver a distopia de modo único e jamais antes criado.
Como Okorafor observa ao final de seu TED, “o sangue da ficção científica africana é profundo e velho, e está pronto para sair, e quando isso acontecer, imagine as novas tecnologias, idéias e mudanças sociopolíticas que inspirarão. Para os africanos, a ficção científica caseira pode ser uma vontade de poder. ”
Então, se é para audaciosamente ir, onde nenhum ser humano jamais esteve, hora de explorar nossos próprios seres e, como primeiro passo, expandir o nosso próprio universo.