O South by Southwest (SxSW) é um festival que reúne em Austin, capital do Texas, 4 sub eventos: o SxSW Interactive (de tecnologia), o SxSW Music (de música), o SxSW Film (de cinema) e o SxSW Comedy (de humor, recém inserido como frente oficial). O festival acontece sempre em março, coincidindo a parte musical com o Spring Break, quando os universitários americanos têm uma semana livre para celebrar o início da primavera. São 10 dias de evento, geralmente com 5 para o Interactive, 6 para a música, e o festival de filmes e o de comédia acontecendo em paralelo aos outros dois, com algo entre 7 e 8 dias de duração. Em 2017, o SXSW vai de 10 a 19 de março.
O COMEÇO DE TUDO
Quem iniciou todo esse movimento foi Roland Swenson, funcionário do jornal The Austin Chronicle. Ele recebeu um convite dos organizadores do New Music Seminar, de Nova York, para que os ajudasse a organizar uma extensão do festival de música em Austin, quando a cidade ainda não tinha muita representatividade. Swenson não topou. Mas, impactado pelo interesse dos nova-iorquinos, resolveu iniciar na sede do jornal uma série de debates sobre o futuro da mídia e do entretenimento na cidade. Tudo isso em 1986. Conhecido atualmente como a meca da inovação no digital e no audiovisual, o SxSW começou a ser concebido em uma outra era, enquanto o e-mail ainda era uma ferramenta apenas usada pelos militares norte-americanos, o muro de Berlim ainda estava de pé, a telefonia celular ainda era objeto de pesquisas futuristas, e os cds, talvez o que havia de mais inovador no momento, começavam a se espalhar mundo afora.
A constatação de todo este papo liderado por Swenson foi de que a cena criativa e musical de Austin era tão talentosa como a de qualquer grande centro no mundo, só que ninguém de fora sabia disso. Outro ponto foi que, cada vez mais, Austin estava atraindo pessoas interessadas em artes e apaixonadas por novas ideias. A busca pelo novo estava cada vez mais se integrando à cultura local. Diante disso, um evento próprio e original foi criado por Swenson, Louis Black (editor e co-fundador do jornal), Nick Barbaro (Publisher no jornal) e Louis Meyers (músico e empresário de artistas). O South By Southwest, nome inspirado na peça North by Northwest, do diretor Alfred Hitchcock, veio com o propósito de conectar o mundo à cultura de Austin.
Por ser uma primeira edição, com pouco tempo de organização, a expectativa era por um acontecimento regional, com cerca de 150 participantes. No entanto, apareceram mais de 700 pessoas de todos os cantos dos Estados Unidos. Também era esperada certa resistência por parte da população, mas de forma surpreendente, todo mundo quis se envolver de alguma maneira. Ao todo, foram 77 atrações musicais e 15 palestras – tudo isso em 15 locais diferentes, entre bares, restaurantes, lojas vazias e estacionamentos. Entre os artistas estavam lá talentos regionais como Reverend Horton Heat (Dallas TX), King’s X (Houston TX), Little Joe y la Familia (Temple TX), Hickoids (Austin TX) e Bad Mutha Goose (Austin TX). Entre os palestrantes estiveram Jim Dickinson (famoso produtor musical), Kim Buie (executivo de longa data na A&R, na época atuando na Island Records) e Ernie Gammage (então presidente da Texas Music Association). Na segunda edição, palestrantes e bandas de outras partes do país começaram a marcar presença. Bob Guccione Jr., editor da SPIN magazine foi o palestrante principal do evento, que contou com 415 atrações musicais e 32 palestras e workshops, em 27 locais diferentes.
O BOOM NOS ANOS 90
Mesmo com Louis Meyers saindo da organização do festival e deixando a cidade no inicio da década de 90, o crescimento foi constante nos primeiros 7 anos. Black, Barbaro and Swenson continuaram liderando o SxSW e a relevância do evento aumentava em muito, à medida que os artistas participantes começaram a ser procurados por grandes gravadoras. Em 1991, por exemplo, passaram por lá The Dixie Chicks, Bob Mould, Uncle Tupelo, Barenaked Ladies e Bela Fleck & the Flecktones. E a ida ao SxSW foi essencial para o sucesso de cada uma delas. Em 1992, o festival teve a notória presença do principal artista da região, de peso global, Willie Nelson. Em 1993, o keynote principal foi com Ann Richards, então governador do Texas. Foi também quando o SxSW passou a ter como base o Austin Convention Center, onde ocorre até hoje. A partir daí o festival passou a ser assunto nos principais veículos de comunicação do Estados Unidos.
O maior turning point, no entanto, foi em 1994. A histórica aparição de Johnny Cash para um show épico e uma palestra de encerramento acabou colocando o SxSW como um dos 5 principais festivais de música do mundo. Outro fato crucial foi o seguinte: um pai levou seus 3 talentosos filhos para se apresentar em um dos palcos do evento. E foi assim que a banda Hanson acabou descoberta por uma grande gravadora para se tornar hit mundial de forma instantânea. Além disso, foi em 94 que um novo sub evento foi inserido: o de multimídia e cinema. Com isso, o SxSW acabou conquistando um novo público fiel: toda a comunidade digital precursora da internet – ligada à tecnologia, à música e ao cinema. Esse pessoal não se encaixava na cultura predominante e acabou encontrando no SxSW o seu lar. O sucesso foi tanto, que, no ano seguinte, o festival de mídias interativas e o de cinema foi dividido: o SxSW Multimedia ganhou espaço próprio e SxSW Film passou a acompanhar toda a programação. Em 1999, o SxSW Multimedia ganhou novo nome: SXSW Interactive, como permanece até hoje.
A ENTRADA PARA O MAINSTREAM
Os anos 2000 foram marcados pelo sucesso instantâneo de artistas desconhecidos que se apresentavam por lá. John Mayer, The Polyphonic Spree, Franz Ferdinand, James Blunt, The Strokes, The White Stripes, entre vários outros, foram descobertos no SxSW. A dinâmica do festival, cheia de surpresas e momentos imprevisíveis, também ajudou a conquistar notoriedade: um show secreto da banda The Flaming Lips em 2006 foi considerado pela revista Time como um entre os 10 principais momentos da história dos festivais de música, junto a momentos marcantes de Woodstock, por exemplo.
Já o SxSW interactive teve sua virada, de alternativo para um dos principais eventos do gênero, na segunda metade dos anos 2000. Em 2006, subiram ao palco o co-fundador da Wikipedia, Jimmy Wales e o criador do Craigslist, Craig Newmark. No mesmo ano, o Screenburn at SXSW, uma parte temática de vídeo games foi adicionada ao Interactive (que posteriormente virou o SxSW Games). Em 2007, o Twitter foi lançado durante o SxSW Interactive, e ganhou notoriedade logo em seguida. Em 2008, Mark Zuckerberg foi entrevistado em um dos painéis, pela jornalista Sarah Lacy. Mais do que pela presença do CEO do Facebook, o destaque acabou sendo gerado pela percepção do público e da mídia de que Lacy ficou perguntando coisas chatas e irrelevantes, enquanto indiretamente tirava onda com as respostas de Zuckerberg. Já a edição de 2009 veio coroar o SxSW como plataforma de grandes hits também no digital: foi apresentado ao mercado o app Foursquare, mais um sucesso global instantâneo. Daí em diante, o Interactive só cresceu. Em 2013, quando a palestra principal do evento foi feita pelo CEO da SpaceX, Elon Musk, foram cerca de 30 mil pagantes, mais do que o triplo de pessoas da edição de 2009, de 9 mil pagantes. Além disso, foi notória a presença de grandes corporações como patrocinadores: Samsung, 3M, Target, American Airlines, Adobe Systems, AT&T, CNN, CBS, CNET, entre outras.
O SxSW Film também explodiu na virada dos anos 2000 para os anos 2010. Em 2009, foram 54 premieres mundiais, para filmes como The Hurt Locker, que levou o Oscar de melhor produção em 2010. A partir de 2012, a presença de longa metragens de grandes orçamentos ficou cada vez mais comum. Isso colocou o evento de cinema entre os mais importantes do mundo. Outra vertente que despontou nessa época foi a de standup comedy. Em 2009, o SxSW ganhou uma ramificação ligada a este mercado, com uma noite dedicada às apresentações humorísticas. Em 2012, foi lançado o SxSW Comedy, acontecendo em todas as noites do festival, além de painéis e conteúdo relacionado. Em 2013, foi lançada também a ramificação Episodic, para cobrir a programação de séries televisivas. Desde então, rolaram vários previews de peso, como Sillicon Valley e From Dusk till Dawn: The Series. Além disso, o talk show Jimmy Kimmel Live! Passou a ser gravado em Austin durante todo o SxSW.
Na mesma época, o mainstream também invadiu em peso o SxSW Music. Nesta edição, houve a presença de Talib Kweli, Lil’ Wayne, Big Sean, Kanye West, The Shins e Bruce Springsteen. Em 2013, entre outras celebridades, o ponto de maior repercussão foi o keynote do músico e produtor Dave Grohl, ex-baterista do Nirvana e líder da banda Foo Fighters. Pra quem não viu, inclusive, vale conferir neste link. No entanto, o interesse de artistas de sucesso pelo SxSW passou a ser muito questionado tanto pela população de Austin quanto pelo público fiel desde as primeiras edições: o proposito do SxSW não era o de revelar artistas talentosos mas desconhecidos? A jornalista Andrea Swensson da National Public Radio, por exemplo, publicou que pararia de frequentar o SxSW por ele ter se descolado da premissa inicial de ser uma vitrine de novos talentos – na música, no cinema, nos games, na comédia, na tecnologia e no digital. No entanto, o impacto econômico do evento para a cidade de Austin, em 2013, já beirava os 200 milhões de dólares.
MINHA PRIMEIRA EXPERIÊNCIA NO SXSW
O ano de 2014 foi o que estive por lá. Foram 10 dias incrivelmente inspiradores. É uma experiência realmente singular. Vi e vivi coisas incríveis, tive contato com projetos surreais, conheci muita gente genial, além de ter visto shows inacreditáveis (optei pelas bandas desconhecidas em locais pequenos, exceto pela apresentação histórica de Willie Nelson no iTunes Festival). Neste ano, os destaques no Interactive foram para Edward Snowden falando via streaming sobre privacidade na internet e Julian Assange, criador do Wikileaks, também falando remotamente sobre o mesmo assunto. Outro tema que inundou esta edição foi o de tecnologia vestível, os wearables, além da presença massiva de grandes marcas com ações promocionais super inovadoras e os participantes brasileiros em peso por lá.
Outra coisa que me chamou muito a atenção foi a imersão pela cidade, cheia de surpresas a cada esquina. Austin tem cerca de um milhão de habitantes, mas como a maior parte da cidade e da população se concentra nos subúrbios, a sensação é de estar em um pequeno município de uns 50 mil habitantes, invadido por milhares de pessoas de todo o mundo. As ruas ficam lotadas, e toda a vibração é fantástica. Além das atividades oficiais espalhadas entre o Convention Center e diversos hotéis, acontecem também centenas de eventos não-oficiais, como casas patrocinadas por marcas e países, com palestras, shows e muita comida e bebida liberada, além de festas, meetups e happy hours em bares e outros locais, muitos até inusitados.
Foi uma experiência tão transformadora, que me levou inclusive, a criar um evento em uma pequena cidade de Minas Gerais, Santa Rita do Sapucaí, que é um polo tecnológico bem inusitado, para reunir gente interessante de áreas como tecnologia, startups, música, economia criativa, entre outras. O Hack Town, nome do festival que em 2017 terá sua terceira edição (de 07 a 10 de setembro de 2017), se inspira no lado B do SXSW (a parte que acontece na rua, não oficial), e já é considerado um dos eventos mais promissores do país.
UMA TRAGÉDIA E O QUESTIONAMENTO DO MODELO
No entanto, 2014 certamente foi o ano mais difícil para o SxSW. Em 13 de março, um motorista bêbado entrou com seu carro em alta velocidade em uma rua interditada com enorme concentração de pessoas. O saldo: 4 mortos e 21 feridos. Foi a primeira vez que o South By Southwest era noticia mundial não por algo ultra inovador ou descolado, mas por uma tragédia. O episódio levou a uma ampla discussão sobre o modelo de crescimento caótico do evento. A empresa organizadora do SxSW foi processada pelas famílias de várias das vítimas. E o festival perdeu seus principais patrocinadores para o ano seguinte – incluindo as marcas Citi e iTunes.
Em função de tudo isso, a edição de 2015 teve menos nomes de peso, resgatando um pouco da sua proposta inicial. A notável exceção foi a presença de Snoop Dogg, que além de vários shows oficiais, fez a palestra principal e focou seu discurso, o tempo todo, no SxSW retomando as suas origens de festival de música para talentos emergentes. Já no Film e no Interactive, ainda restaram grandiosidades: foram várias premières de peso, como os filmes Furious 7 e o documentário Steve Jobs: The Man in the Machine. Nas palestras e painéis, até eventos oficiais ligados ao governo se passaram por lá, como a cerimônia de juramento da nova secretária de marcas e Patentes dos EUA e da nova Secretária de Comércio. Nas novidades emergentes, o Meerkat, um app de livestream de video via Twitter foi apontado como o grande lançamento da temporada, mas logo em seguida perdeu espaço para o Periscope, do próprio Twitter. Justamente no ano em que o SxSW teve sua maior rejeição, o evento acabou sendo discreto, mas cumpriu seu papel.
MAIS UMA POLÊMICA
No entanto, meses depois, 2015 seria marcado por outra polêmica: o festival anunciou o cancelamento de dois painéis sobre assedio em games online. O motivo: ameaças de violência durante a edição 2016. Em resposta aos cancelamentos, o Buzzfeed e a Vox Media, plataformas de notícia de altíssima relevância global, anunciaram a sua saída da cobertura do SxSW. Logo em seguida, a organização assumiu que a atitude havia sido um erro. E não só reconsiderou os painéis, mas também promoveu um dia inteiro dedicado a assédios online, com o ‘online harassment summit’, em 12 de março.
A HISTÓRICA EDIÇÃO 30 DO SXSW
A edição 2016 marcou 3 décadas de festival com o que pode ser considerado o ápice da história do SxSW: o então presidente norte-americano Barack Obama solicitou à organização para promover um painel de abertura no SxSW Interactive. Evan Smith, CEO e editor chefe do The Texas Tribune, fez uma entrevista ao vivo sobre ‘engajamento cívico no século 21’, que você pode (e deve) assistir aqui. O intuito do ex-presidente foi convidar o público a aplicar suas ideias e talento para que a tecnologia trabalhe em prol do país e das pessoas – principalmente na ampliação da participação pública no processo político e na luta contra o aquecimento global. Além dele, sua esposa, a primeira dama Michelle Obama, participou de um painel no SxSW Music para discutir a iniciativa Let Girls Learn, projeto que visa quebrar as barreiras que impedem que 62 milhões de meninas mundo afora possam frequentar a escola. Já tinham passado pelos palcos do festival o ex-vice presidente dos EUA Al Gore e Chelsea Clinton, filha do ex-presidente Bill Clinton. A aparição do casal Obama foi, no entanto, a primeira vez que um presidente em ofício e uma primeira dama se apresentaram no SxSW. Foi um verdadeiro marco, que elevou o festival a um nível ainda maior.
Sem dúvidas, trata-se de um case incrível. O SxSW mudou de forma surpreendente e significativa e pode ter se tornado, inclusive, controverso para muitos. No entanto, continua cumprindo o seu papel inicial: ser uma plataforma sem igual para que pessoas criativas cresçam e se desenvolvam ao conhecer outras pessoas, compartilhar ideias e ter contato com projetos incríveis. Além disso, é um exemplo e tanto de como permanecer relevante ao longo de décadas, não apenas se mantendo atual, mas se adaptando para ser o que há de mais inovador no seu segmento, tanto em termos de marca como de produto. Atualmente, a empresa organizadora também realiza outros 3 eventos: os SxSWedu, conferencia de inovação na educação, e o SXSW Eco, ambos em Austin, com formato mais restrito, em diferentes épocas do ano, além do SXSW V2V, em Las Vegas, conferência focada em startups altamente inovadoras.
Para você que, assim como eu, está prestes a embarcar para o SxSW 2017, desejo um ótimo evento e fica o convite para nos encontramos lá em Austin.
Já você que ficará no Brasil, não deixe de acompanhar a cobertura incrível realizada anualmente aqui no Update or Die. Fique ligado.
Até mais!
[signoff]
Erica Teles de Menezes olha só :)
Luiz Felipe Costamilan Maria Beatriz Coutinho Costamilan Lucas Costamilan Luiz Costamilan Ana Luiza Rangel para vcs entenderem mais :)
Cel Leal Danilo Muniz Guilherme Oliveira Leonardo Visioli Luiz Gustavo De Souza Vinicius Alejandro Geraldo Machado
Luzia De Lasa Canepa