Eu sei, eu sei … todo mundo um pouco mais ligado no que está rolando no mundo já viu um post, uma matéria, uma reportagem, um video ou um story com alguém falando sobre realidade virtual.
Já se falou de VR (eu sou mais íntimo, então costumo chamá-la assim, não me julgue) como a “máquina definitiva de criação de empatia”, como o futuro das notícias e até eu já fui falar no SXSW do ano passado como o VR é o futuro do storytelling. Enfim, muita gente falando muita coisa sobre esse tal de VR, há uns bons anos.
Mas frequento o South by (outro amigo íntimo que eu prefiro não usar o nome completo) desde 2014 e, além deste evento, já fui em conferências no Canadá, no Vale do Silício e vários outros locais pra ver a ponta da ponta desta industria tão nova. Sempre vi muita falação (da boa, mas ainda assim falação) e um bocado de tech-demos, curtas e experiências em espaços que mais pareciam uma feira de ciências estudantil com alunos bem mais velhos e feios. Uma galera com um pouquinho de visão a mais, conhecimento no assunto e que já sabia da revolução prestes a acontecer por conta da narrativa imersiva, mas a brincadeira ainda ficava mais na base da vontade de se criar um mercado, do que da realidade real mesmo (com o perdão do trocadilho infame).
Este ano, depois de participar de um painel a respeito de como fazer VR no Brasil, com o Quico Meirelles, entrei no Virtual Cinema (área dedicada à mostra de conteúdo em realidade virtual) do SXSW, esperando ver o mesmo tipo de ambiente que me acostumei: quem tem qualquer coisa pra mostrar aluga uma barraquinha (ou barracão, dependendo do cacife) e cria-se uma mistura esperançosa e esquizofrênica de fabricantes de garagem, intrépidos produtores de conteúdo e uma ou outra grande empresa tentando marcar território.
Só que esta vez fomos surpreendidos. Nada disso. O salão tinha mais de 30 experiências em realidade virtual, cuidadosamente selecionadas como parte de uma mostra oficial e competitiva. Depois de uns 15 minutos um bocado incrédulo, procurando loucamente os nerds tecnólogos com seus protótipos maravilhosos e não encontrando nada disso, me caiu a ficha: no salão só estavam os artistas/diretores/produtores! A realidade virtual deixou de ser assunto pra feira de ciências e painel que se discute seu potencial maravilhoso com outros visionários entusiastas e virou uma mostra de conteúdo audiovisual pro público apreciar.
Chega de falação! E pensando um pouquinho melhor, não é só no SXSW. Em Sundance, vi o mesmo fenômeno no New Frontier (área similar dedicada às experiências imersivas), e em abril, o festival de cinema nova-iorquino de TriBeCa terá o seu Virtual Arcade com quase 30 peças imersivas, onde também terei a honra de fazer a première do meu curta em VR, rodado dentro de prisões de segurança máxima na Califórnia.
Se ainda alguém tem dúvida sobre o potencial narrativo da realidade virtual, achando que é tecnologia “modinha”, como aconteceu uns anos atrás, quando o 3D pareceria dominar todas as telas do planeta, os grandes festivais de cinema estão dando a resposta definitiva. O VR é sim uma forma nova de se contar histórias pra gente grande. Ou alguém se lembra de ver filmes em 3D com destaque e uma mostra paralela em Sundance, Cannes e TriBeCa?
Foi a primeira vez que pude andar pelo ambiente sem medo de ver algum conteúdo com tecnologia promissora, mas digno de vergonha alheia. O paraíso! Quem tiver oportunidade, não perca a chance de experimentar (de preferência com um amigo junto) o “Life of Us” (do Chris Milk do TED que linquei lá em cima), que te coloca como protagonista de toda evolução da vida na Terra.
Assisti a uma pequena obra de arte, ainda incompleta, chamada “Vestige”, onde acompanhamos de perto o drama de uma mulher vendo um ente querido ir embora pelo maldito câncer de uma maneira muito mais poética e bonita do que imaginei ser possível.
E mesmo numa mídia tão recente, foi uma outra novidade que me chamou ainda mais atenção: realidade virtual realista e interativa! Até agora, ou víamos narrativas no VR cinemático, em que você é envolvido pela imagem, mas não pode andar dentro do ambiente virtual; ou no VR interativo em computação gráfica, que tem dinâmica e estética mais próxima dos games. Com o interesse no assunto nos últimos anos, as técnicas de se captarem ambientes e pessoas e recriá-los foto-realisticamente em um espaço 3D se tornaram mais acessíveis e, então, começa a ser possível estar dentro de uma solitária, com um ex-detento te contando como foi passar sete anos ali dentro, se aproximando ou se afastando dele. Vivendo o “After Solitary” (da produtora da Nonny, citada lá em cima também) e dentro desta história, em menos de um minuto fiquei tão chocado de estar ali, que instintivamente me ajoelhei pra ficar na mesma altura do rapaz sentado no colchão da cela e fiquei completamente imerso na loucura de viver ali.
Como toda criança que sonha em ser astronauta, também fiquei bem emocionado de estar com o Buzz Aldrin num papo sobre como colonizaremos Marte. E o mais incrível foi ser teletransportado com ele o até o planeta vermelho na experiência “Buzz Aldrin Cycling Pathways to Mars” .
Havia muito mais coisa boa lá, passando por um papo com o Obama até apresentações surreais do Cirque du Soleil, mas a última novidade que vale prestar atenção foi uma experiência de mão dupla, ao vivo, onde caí no quarto de uma stripper em Vegas que interagia comigo (vestida porque o evento é moderno, mas também não é bagunça!). A coisa é tão impactante, que a empresa, obviamente vinda do mundo do pornô, agora esta pensando em ampliar os horizontes pra lidar com serviços pra pessoas com quadro de depressão e solidão.
Enfim … Infelizmente não deu pra deixar de ser mais um texto com um monte de falação sobre esse tal rock n roll, digo, VR. Mas, fica a certeza e tranquilidade em afirmar que chegou a hora de parar de ler sobre e definitivamente dar um jeito de assistir (e fazer!) realidade virtual. Porque ela virou gente grande. Ainda é jovem, como um universitário que vai tomar seus belos porres e fazer muita bobagem, mas também madura e crescida suficientemente pra provocar muita coisa boa, desde que feita por um artista (e não mais um engenheiro) louco pra mostrar seu trabalho, como os que vi no meu querido South by. Finalmente.
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Leandro Ferreira