Artistas como J Balvin, Maluma, Becky G e Anitta refletem um discurso de orgulho latino e representam uma comunidade gigantesca
Muita gente acha que o movimento latino nos top charts da cultura pop é algo que surgiu com Despacito ou Mi Gente, do Luis Fomsa e J Balvin, respectivamente. Não, essa latinidade toda vem sendo construída há tempos.
É estranho, mas muita gente se esquece que Shakira, Ricky Martín e J-Lo são membros da comunidade latina. Que Gloria Stefan e Selena vieram antes abrindo caminhos — a duras penas — e mostrando o talento que, btw, é super criativo.
A grande diferença de quando J-Lo ou Shakira iniciaram no mercado americano, especificamente, para os artistas latinos consagrados da atualidade é que os primeiros nomes precisavam passar por um processo de “adaptação” ou até mesmo, “higienização” para a cultura americana, dessa forma, o som não soaria tão étnico ou até mesmo, folclórico. Agora, existe um senso de comunidade criado em torno do assunto que faz com que a cultura americana absorva organicamente essa latinidade.
Esse processo mudou muito entre Gloria Estefan e Cardi B, por exemplo.
O reggaeton, estilo musical de maior sucesso na América Latina, geralmente segue uma divisão de tempo básica, de 4/4 e utiliza elementos sonoros característicos como o violão espanholado. O gênero musical surgiu nos anos 70 no Panamá com a mistura da sonoridade jamaicana, elementos latinos e do hip-hop — que ainda engatinhava como estilo musical. Nos anos 90, o reggaeton virou febre, principalmente em Porto Rico, com nomes fortes como o de Dandy Yankee representando o estilo — quem não se lembra do hit Gasolina, de 2004?.
Entendemos melhor a exponencialidade do reggaton quando traçamos paralelos importantes do assunto, como a crise do mercado fonográfico, o acesso à internet nos países latinos e o comportamento digital heavy user das pessoas nesses países. A junção desses elementos com a representatividade do reggaeton só podia trazer um resultado: alcance.
Entre 2014 e 2017, por exemplo, o gênero cresceu 119% dentro do Spotify, quando comparamos esse número com o crescimento do pop, que foi de 13%, entendemos que o reggaeton é um case de sucesso.
Na cultura latina contemporânea, tudo é muito e a internet só potencializou tudo
Matemática do tsunami latino: números populacionais + acesso e tempo gasto na internet = sucesso de vários artistas latinos.
É a primeira vez que artistas conseguem ganhar muito dinheiro com serviços de streaming e redes sociais. Nomes como os dos colombianos J Balvin e Maluma, com mais de 10 bi de views em seus respectivos canais no YouTube, ou até mesmo o da brasileira Anitta com 15 milhões de ouvintes mensais no Spotify, faz com que esse seja um mercado milionário e que esses artistas ocupem lugares inimagináveis há 10 anos atrás.
Imagine você: se somarmos a audiência da internet entre o Brasil, México, Argentina e Colômbia, estamos falando de mais de 250 milhões de pessoas. Acrescente esses números ao hype criado em cima desses artistas, aos seus resultados particulares, a estratégias de colaborações e de lançamentos super sofisticadas e dificilmente teremos um insucesso.
A comunidade latina entendeu que a fórmula do crescimento consiste em se ajudar.
44 milhões da população americana é formada de imigrantes, desse total, 39% são latinos, número que só perde para imigrantes asiáticos. A atual política imigratória proposta pelo governo Trump fez com que as comunidades se unissem para combater o pensamento conservador e isso impulsionou esse sentimento de orgulho de suas origens e ancestralidades.
Com números tão expressivos e essa necessidade política de manifestar suas raízes, artistas latinos entenderam que as colabs iriam causar um efeito avalanche em seus resultados.
Taki Taki, o último hit que celebra a parceria do DJ Snake, Selena Gomez, Ozuna e Cardi B soma mais de 1 bilhão de views no YouTube. O single Cuatro Babys de Maluma com Trap Capos, Noriel, Bryant Myers e Juhn já conta com quase 900 milhões de acesso.
Comparando esses números com o clipe de Million Reasons, por exemplo, da Lady Gaga — uma artista com uma penetração internacional muito maior — que tem pouco mais de 190 milhões de views, entendemos a dimensão do reggaeton e do mercado latino.
Maiores artistas latinos de reggaeton
J Balvin — Colômbia
Luis Fomsi — Porto Rico
Nati Natasha — República Dominicana
Maluma — Colômbia
Daddy Yankee — Porto Rico
Nicky Jam — EUA (filho de mãe Dominica e pai Porto-Riquenho
Yandel — Porto Rico
Anitta — Brasil
Lali — Argentina
CNCO — EUA (filhos de latinos)
Ozuna — Porto Rico
Becky G — EUA (filha de mexicanos)
Greeicy — Colômbia
Bad Bunny — Porto Rico
Karol G — Colômbia
O fim do eurocentrismo e o crescente número de casais inter-raciais refletem os novos top charts globais
Os movimentos migratórios e as mudanças culturais vindas da miscigenação com os grupos de refugiados tornarão o mundo cada vez mais multirracial. Segundo dados da pesquisa “O Consumidor do Futuro”, da WGSN, até o ano que vem, mais da metade dos americanos com menos de 20 anos pertencerão à alguma minoria étnica e haverá mais brancos envelhecendo do que nascendo. E isso muda tudo.
Segundo o Instituto de Estatística Italiano, o crescimento de casamentos inter-raciais na Europa cresceu 172% desde 2001.
Todos esses dados são refletidos no cotidiano. Eu costumo pensar que a cultura pop é um termômetro para onde o mundo está caminhando em termos de consumo. Se analisarmos os sucessos dos top charts dos últimos tempos chegaremos em dois estilos: o K-Pop — estilo de música pop-coreana — e o reggaeton.
O fato mais interessante para se concluir é de que o reggaeton conseguiu unir países diferentes da América Latina — até mesmo o Brasil, que além da barreira da língua, não ouvia música em espanhol desde a ascenção de artistas como Julio Eglesias, Ricky Martin e Alejandro Sanz — em nome de um fio condutor em comum: o de exaltar a cultura do povo latino. Daí surgem os mashups de estilo. Reggaeton com funk, trap, pop, hip hop, reggae e diversos outros sons que são ainda mais regionalizados.
só um erro! no lugar da Lali é a Tini como representante da Argentina. A Tini acumula numeros de views, streams e vendas bem superiores aos da Lali.