Ele olhava desconfiado para o corredor escuro. Faltava pouco mais de 30 metros para uma viagem imersiva, por mundos imaginários. Durante 1h42 acompanhei a determinação de André, dividido entre a curiosidade e o receio. Entre a adrenalina e a desconfiança. Entre o mundo real e a fantasia.
A “Sessão Azul”, especialmente pensada para autistas (TEA), down e outras pessoas com deficiência, se multiplica gradativamente Brasil afora, principalmente em grandes redes como o Cinemark, Cinépolis e UCI. O som mais baixo, as luzes acesas e a liberdade para se movimentar deixam o ambiente propício e acolhedor. Foi em uma dessas sessões que eu conheci o André.
Talvez essas condições tenham estimulado o jovem, que chegou sorridente. Mas a aventura não seria tão fácil – em geral os heróis da ficção também passam por provações. Ele se recusava a entrar, apesar da insistência da mãe e da professora.
Com muita paciência (e carinho) o primeiro passo foi dado. Literalmente. A porta aberta, o olhar atento para dentro do corredor escuro. Mais um passo e agora a porta estava às suas costas. Mais um, e a parede do corredor era sua fortaleza.
A jornada do herói tem seus revezes. O do André foi retornar para a porta quando a visão já quase alcançava a grande tela. Mas ele não desistiu, porque, tal qual um herói, suas motivações estão ali. E ali também estava quem ele confiava. A caminhada recomeçou e o corredor escuro foi encurtando. Agora a grande tela estava ao alcance da visão e as imagens se movimentavam no ritmo da batida do coração.
De onde eu estava, consegui assistir toda a situação de frente, enquanto também via a reação de outras crianças. Uma vibrava a cada lance de ação. Outra não desgrudava os olhos da tela, mal piscava. Havia uma criança que repousava placidamente, acolhida pelo abraço da monitora, sentada na escada. Um abraço que envolvida cumplicidade e, ao mesmo tempo, era do tamanho dos sonhos de cada uma delas.
André viu quase todo o filme em pé, em uma luta constante entre ficar e desistir. E como um herói, não desistiu. Conversei com a mãe ao final da sessão – ele prometeu voltar na próxima. Na próxima aventura. No próximo desafio.
No próximo capítulo de sua história…