Não iremos evoluir para algo melhor. Não somos Pokémon

O que muda no comportamento social e de consumo com a COVID-19
Não iremos evoluir para algo melhor. Não somos Pokémon Não iremos evoluir para algo melhor. Não somos Pokémon
Não iremos evoluir para algo melhor. Não somos Pokémon
Avançamos sempre no tempo, mas não nos tornamos melhor ou pior.
Não iremos evoluir para algo melhor. Não somos Pokémon

Não sou um entusiasta da COVID-19, daqueles que acreditam na evolução humana pós coronavírus. Não iremos evoluir para algo melhor. Não somos pokémon.

A intolerância não dará lugar à empatia. A crise econômica que virá deve deixar isso evidente e será um contrapeso determinante nas relações humanas que envolvem o interesse coletivo e o individual.

Ainda assim, de certo poderemos notar mudanças de comportamento, em particular, o comportamento de consumo. Consequência tanto da crise de saúde, como da crise econômica. Vou apontar aquilo que já é possível vislumbrar:

  • A liberação do isolamento social e a reabertura do comércio deve tornar visível o anseio pelo consumo reprimido, especialmente das atividades de lazer e entretenimento, incluindo os restaurantes, bares, cinema etc. O lazer a céu aberto e o ecoturismo devem ganhar evidência. Os lugares instangramáveis serão ainda mais atraentes se forem ao ar livre. Só não haverá maior crescimento de vendas, por conta das limitações que a reabertura gradual deve impor. 
  • A área do marketing de influência deve notar um movimento entre os influenciadores digitais, reforçando cada vez mais aquilo que é verdadeiro e faz sentido para o dia a dia da sua audiência. Mais recomendações e dicas inseridas no seu conteúdo de forma relevante. Menos publiposts descontextualizados. Menos ostentação de um estilo de vida blasé e mais narrativas da vida pautadas por conquistas. Vale a ressalva: sempre existirão as celebridades que ganham audiência ostentando seu lifestyle que é sonho de consumo do indivíduo comum, mas agora essa audiência tende a diminuir.
  • O usuário das redes sociais, agora mais crítico e ciente da influência gerada por lives, stories e posts, tendem a rechaçar, mais do que antes, conteúdos considerados politicamente incorretos. Nada demais, contanto que não se torne um aparelho de controle e vigilância social, numa espécie de panóptico social: uma sociedade controlada e vigiada pelos seus pares nas redes sociais.
  • Também há o risco da crença de que abrir mão da privacidade dos dados pessoais é uma forma de garantia de segurança e saúde. O acesso aos dados pode de fato trazer vantagens que vão desde a publicidade mais relevante até a própria segurança do indivíduo, mas é importante que ela seja devidamente debatida e regulamentada. A China é um bom exemplo de como a vigilância do cidadão através de seus rastros digitais é capaz de auxiliar na contenção de uma crise viral, mas também é uma forma autoritária de controle da liberdade e autonomia do indivíduo.
  • Deve crescer a porcentagem de consumidores que esperam mais das empresas do que apenas um bom produto. Querem saber qual o papel dessa empresa na comunidade do seu entorno. Qual sua importância na vida das pessoas, algo que vá além da venda do produto. Durante a crise da COVID-19 muitas empresas privadas mostraram capacidade de colaborar e esse papel social deverá ser cobrado em algum nível daqui pra frente. Nesse ponto é evidente que a crise ajudou a acelerar o processo pela qual as marcas já caminhavam na busca por um papel mais sustentável, responsável e com propósito alinhado a valores da sociedade. Sem dúvida as empresas continuarão nesse caminho, não por serem boazinhas, mas porque essa reputação é importante para a longevidade da marca e manutenção do preço do seu produto. Pesquisas já evidenciaram que o consumidor brasileiro está disposto a pagar mais caro por produtos de marcas as quais ele reconhece e acredita no seu posicionamento em relação a questões contemporâneas da sociedade.
  • As lives que cresceram tanto em volume em tempos de isolamento social, deverão naturalmente diminuir quando a rotina voltar, mas ainda assim, devem ganhar espaço, pois afinal, haverá um novo público que antes não tinha esse hábito. YouTube e outras plataformas de streaming também devem ampliar audiência com esse novo público.
  • A crise econômica que virá nos próximos meses deve ser outro elemento crucial neste movimento de ações de solidariedade e atenção pelo interesse coletivo. Com o agravamento da crise econômica, ainda mais ações sociais estarão em pauta. Empresas buscarão mostrar empatia, mas apesar de movimentos como #nãodemita, a diminuição do quadro de colaboradores será inevitável. Com o agravamento da situação econômica do indivíduo, a intolerância e a violência social tendem a aumentar. 
  • Pode haver ainda, um movimento significativo no consumo do luxo e do supérfluo como recurso para o escapismo. Encontrar formas de escape para a dureza que o mundo vai impor é importante e essencial para a saúde mental e estes escapes podem variar desde a prática de meditação até o consumo.
  • A transformação digital forçada pelo isolamento trouxe pontos positivos para áreas como o comércio online e o delivery. O fator negativo que pode haver nesse ponto é o reforço de uma cultura do fácil acesso, em que atividades do cotidiano são realizadas a partir de um toque no celular, sem qualquer interação humana. Não se aprende empatia ou resiliência num mundo em que o dia a dia se dá através de interações com apps. Conviver com o outro é essencial, inclusive em rotinas banais como comprar algo numa loja física, assistir uma aula presencial ou conversar com seu amigo frente a frente (e não pelo Whatsapp). 

A evolução humana se dá de maneira cíclica. Evoluímos e avançamos no tempo, mas não nos tornamos melhor ou pior. O comportamento da sociedade reage como um pêndulo, ora enfatizando qualidades, ora os defeitos. Avançamos como em uma espiral, que é determinada por fatos como a atual crise causada pela COVID-19. Para crescer e ganhar maturidade, só mesmo o exercício constante de reflexão e prática de questões como essas apontadas aqui. 

2 comments
  1. Olá Eric, achei muito interessante seu texto, agradeço! Seus apontamentos do pós-COVID me contemplaram e notei algo em comum com um pensamento que tive a respeito do pré-COVID: o último comportamento da transformação digital, mais especificamente a diminuição nas interações humanas, isso já estava tão em alta antes que chego a pensar que o isolamento social ou apenas dar uma pausa nas crescentes “correrias” da vida, já havia se tornado um desejo de muitas pessoas antes da pandemia, eu mesmo sonhava em fazer um retiro de algumas semanas ou meses, tal qual o que vivencio hoje – o que não aconteceria se não fosse essa pandemia, porque tinha compromissos profissionais que foram cancelados. Estamos cada vez mais alienados a um universo digital, cada dia mais acessível, diverso, personalizado e individualizado (tipo “uau, isso é exatamente o que eu queria/esperava”), que chegamos a preferir a interação digital à real, e perdemos noção do que acontece no macro, no Planeta. Enquanto muitos de nós recebemos em nossas casas produtos do outro lado do globo com um toque do celular, o desmatamento de florestas nativas bate recordes, a poluição de rios segue impune, e evitamos encarar/debater esses problemas, porque é “bad vibe” demais, ou porque nos sentimos impotentes como se nada que fizéssemos faria alguma diferença. Existe uma forte hipótese científica de que a pandemia é uma consequência direta da nossa destruição do meio ambiente, visto que os outros animais que mais nos transmitem doenças são justamente aqueles que mais sofrem com as alterações ecológicas causadas por nós, como sugere pesquisas de importantes institutos e universidades do mundo (leia a reportagem “Virus similares al del covid-19 pueden seguir surgiendo” em ElComercio.com). Ou seja, esse último comportamento humano que vc cita pode não ser uma consequência do COVID-19 mas uma de suas causa.

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