E não há garantias de que eles não sejam dois agentes ou vítimas deste sistema. De alguma forma, a culpa, o amor, o medo e a desordem refletem exatamente o que eles são. E como Narciso, o personagem do mito grego que morre afogado encantado pela própria beleza e é citado na epígrafe de “Um Copo de Cólera”, eles estão condenados a olharem apenas para o que há de pior um no outro para sobreviverem.
Se o amor entre essas duas pessoas não poderia acontecer por algum tipo de repressão externa que nós não conhecemos, ele também não pode ser tranquilo longe de tudo e todos.
Aqui, a briga, por mais violenta e crua que seja, nasce como a única revolta possível.
E daí impedir que o outro vença a discussão talvez fosse uma forma de ambos não perderem um ao outro. Narrado quase que na totalidade por ele, o último capítulo é dito pela mulher e tem o mesmo título do primeiro, “A Chegada”. Como uma voz inversa, mas estranhamente parceira, a jornalista não confirma os fatos, não acrescenta informações.
Ao tomarem da cólera, o casal encontra alívio. É o santo graal do convívio eterno, do mistério mútuo para que dois animais domem os instintos e apenas vivam. Neste mundo turvo e ruim, que tortura e aprisiona puramente como uma demonstração de poder, em um canto no meio do nada, onde só há espaço para o sentimento mais básico, puro e humano, a repressão também pode ser uma forma de amor.