A Black Friday já bate à porta e, com ela, a clássica pergunta: o que vai marcar a temporada de compras em 2021? Talvez o live-commerce? Muitos diriam que sim, com toda a certeza. De fato, a junção de entretenimento, influenciadores e vendas ao vivo será ferramenta elementar para muitas marcas neste período. Mas e os games? As centenas de notícias envolvendo marcas e universos imersivos de jogos como GTA, Fortnite, Avakin Life, League of Legends, entre muitos outros, já não são suficientes para transformar essas plataformas em locais de vendas, de fato? E não digo de skins, armas ou acessórios utilizados dentro do próprio jogo. Isso já é realidade há anos. Mas me refiro a venda de produtos físicos a partir destes mundos.
O gaming commerce, G-Commerce ou gaming e-commerce, bem como outras derivações do conceito, remetem às transações nos universos imersivos. Do ponto de vista virtual e transacional, já é uma indústria bilionária, já que só o Fortnite, da Epic Games, movimentou US$ 9 bilhões, em 2018 e 2019, tendo em suas skins e acessórios de franquias licenciadas, como Marvel, por exemplo, fonte importante de lucros. Há alguns dias, a marca de luxo Balenciaga anunciou uma parceria, também com o Fortnite, para vestir de roupas e acessórios os gamers. Louis Vitton, Gucci, Chanel, Valentino e Marc Jacobs são algumas das dezenas de outras que levam os games a sério.
Aqui no Brasil, a Amaro, no ano passado, também investiu na criação de uma personagem para o Animal Crossing, que lá fora já fechou parcerias com marcas como Gucci, por exemplo. Luciana Cardoso, diretora de criação da Amaro, explica que a ação desenvolvida junto com a agência Soko tinha como objetivo inserir a marca em um ambiente em que os consumidores já estavam habituados. Sobre a evolução do game como plataforma de vendas, ela explica que a interação gera tendências, mas o mais importante “foi trazer para o mundo real aquilo que se viu no game. Ou seja, tirar do virtual e materializar na vida das pessoas em forma de uma coleção cocriada com os gamers.”
O Boticário, que criou uma loja no Avakin Life neste ano, teve a ação como um grande experimento para entender os hábitos dos consumidores e, por que não, começar a vender, de fato, produtos por meio do game, só que no futuro. Ainda no caso da marca de beleza e perfumaria, em menos de um mês, a loja já havia registrado nove milhões de visitas. Mas muito além do mundo virtual, o que falta, de fato, para que os games se transformem em e-commerce? De acordo com Andrea Dietrich, consultora de transformação digital & branding especializada em varejo, se o futuro do varejo está em ser cada vez mais centrado no cliente, o mundo dos games não pode estar mais fora dessa estratégia.
“Esses são os hábitos da nova geração de consumidores que está construindo uma realidade paralela nos jogos onde podem ser personas e viver de forma diferente do que são na realidade. Moda, por exemplo, sempre foi uma forma de auto expressão, e se agora as pessoas podem construir suas várias versões digitais, nada mais oportuno do que as marcas estarem ali, apoiando na construção dessas realidades. Com tudo isso, a presença em um game, o chamado G-Commerce, vai além do olhar para transação diretamente na plataforma, está, principalmente, na geração de desejo e no fluxo de vendas em todos os demais canais”, explica Andrea.
No Brasil, ela menciona três cases que ilustram movimentos concretos neste sentido: a Riachuelo, que faz uma imersão neste universo desde 2016 licenciando franquias como League of Legends, Street Fighter, Zelda, Super Mario, Fortnite e Rainbow Six. A loja de O Boticário em Avakin Life, mencionada anteriormente, e a Renner, que desenvolveu um mapa que recria uma loja física, mas no ambiente virtual de Fortnite. Em todos os casos, ainda falta vender os produtos físicos a partir do game. Como se a plataforma do jogo fosse o próprio e-commerce e cujo resultado final seja um pacote na casa do jogador. “Esse canal só tende a ganhar cada vez mais relevância nas estratégias de vendas”, reforça Andrea.
Mari Galindo, sócia-fundadora da Nice House, casa de creators que desenvolveu produtos dentro do Avakin Life, conta que, dentre os desafios do experimento esteve a realização de transações de moedas reais, ou seja, cobrar em real, por uma peça com valor 100% digital e exclusiva para aquele jogo. “Para os games se transformarem em grandes plataformas de e-commerce, é necessário entender onde está o maior valor agregado, seria na oferta de produtos exclusivos? Ou talvez nas opções de pagamento (utilizando coins do jogo)? Ou na experiência de compra?”, explica.
Ainda de acordo com Mari Galindo, existem outros desafios ante à segurança e controle desses universos. “O que pode colocar essa realidade um pouco mais distante são questões relacionadas a segurança (fraude, itens falsificados), logística e sistemas de integração (quando falamos em cenário híbrido, onde o produto obtido dentro do jogo também é enviado fisicamente para quem comprou)”, alerta. De acordo com a Newzoo, a receita com games neste ano será de US$ 175,8 bilhões. Vale lembrar que parte expressiva das receitas vem das negociações feitas dentro dos jogos e que 52% desse montante vem dos mobile onde a distância entre um clique e uma compra é cada vez menor.