Um dos maiores eventos internacionais de inovação passa e a crise criativa continua… ‘Como realizar projetos tão brilhantes?’ ‘Será que consigo realizar algo, mesmo não tão brilhante assim, que me ajude, ao menos, a pagar os boleto e a fatura do cartão que veio alta pra caraio?’
Pois é, por isso que eu acho que vocês gostariam de ler as minhas notas e reflexões sobre a palestra do Jack Conte, chamada: CREATING IN A SHIT STORM, “Como superar o ataque sem fim do mundo e continuar criando“(e eu acrescentaria: E como seguir sendo criativo depois de voltar pra casa e perceber que a vida não é um eterno SXSW de inspiração)
Péra, mas e quem é Jack Conte?
Sério, o Jack é o cara de quem eu já era fã por muitas coisas sem saber que era ele por trás disso tudo. O cara é co-estrela do Pomplamoose, CEO da Patreon, plataforma que permite que criadores de conteúdo façam uma grana através de um serviço de assinaturas e integra outros projetos musicais deliciosos como Professional Musicians React e Scary Pockets 🔥
Ao longo da palestra, Jack compartilha algumas histórias e sábios conselhos sobre como tenta continuar criativo e, o divertido da palestra, é o quão antagônicos são os exemplos. Tem casos onde aquele conselho deu muito certo, outros, uma catástrofe. Amei a transparência. Mas vamos lá, independente da palestra em si, acho que cada tópico que ele abordou ressoou em mim como gatilho pra diferentes barreiras que enfrentei/ainda enfrento na jornada criativa, por isso, resolvi compartilhar com vocês esse mix de notas sobre a palestra e minhas percepções/vivências pessoais:
Permanecer firme com seus propósitos?
Começar algo do zero tem uma série de desafios. Um deles é não ter referências anteriores para antever o tipo de merda que pode dar. Você pode ter dados, intuição, vidência… Mas a real é que, enquanto você não testar, jamais saberá. Foi divertido ver o quanto esse mesmo conselho pôde ter caminhos diferentes em casos onde, na criação do Patreon, Jack queria criar um sistema que libertasse criadores de um modelo opressivo de calendário, que os submetesse a uma prestação de contas mensal para os apoiadores. Por isso, Jack seguia firme com o propósito de que no Patreon, criadores poderiam criar assinaturas por projeto, JAMAIS por mês. Lançou a plataforma…e qual foi a maior reclamação da comunidade criativa? Queriam uma recorrência de grana entrando, logo, exigiam que a Patreon permitisse um modelo de assinatura mensal 😜
Por outro lado, meses antes, quando Jack teve a ideia do Patreon, selecionou 40 criadores de conteúdo, multidisciplinares para uma pesquisa sobre o quão relevante seria uma plataforma que permitisse que fossem financiados por seus fãs através de um serviço de assinatura… Todos disseram que não ia dar certo… “Cuidado com conselhos”, diz Jack. Essa ideia de que a experiência de outros pode te ajudar a pular algumas etapas esconde a armadilha de te passar também as limitações, frustrações e barreiras que podem te fazer desistir antes de tentar. [O perigo dos conselhos também foi tema na entrevista com o BECK, que relatou o quanto foi desencorajado com suas primeiras tapes, onde até lhe sugeriram regravar seu (ainda não) Hit “Looser” pq era “suja” demais.]
Eu sou da opinião do Receba os conselhos, filtra e TESTA!
Permaneça firme com os seus propósitos, até que você prove pra si mesmo que está errado haha aí, voa pro plano B.
Só não seja o teimosão arrogante que TEM CERTEZA que tá certo. Se você quer estar no ramo da inovação e você tem certeza de algo, você já tá errado 😚
Monte o seu “Dream Team”:
Sendo Jack um grande fã do Prince, era difícil pra ele admitir que tava fazendo coisa demais tendo o ícone do Pop como referência haha a barra é muito alta. Muitas vezes nos vemos absortos em muitas funções necessárias pra realizar um projeto. Ter essa determinação pra realizar uma ideia é MARAVILHOSO. Palmas pra você!!! Mas pára pra pensar…. Será que uma boa parte dessas funções que você acumula não estão te afastando de onde você brilha? Estão longe das suas principais habilidades e/ou daquilo que gosta de fazer… É apenas aquilo que você tem que fazer, pra conseguir realizar aquilo que realmente gosta de fazer. Hora de montar um puta time!
Liste aquilo que você ama fazer e aquilo que faz porque tem que fazer… organize esse escopo e busque por pessoas que gostariam de se associar a você, que gostem de fazer aquilo que você só faz porque tem que fazer.
Jack e Nataly, sua esposa, passaram por esse desafio na administração do Pomplamoose. Chegou ao ponto onde fazer cada novo vídeo era um fardo, causado por toda burocracia e processo que envolviam os acordos, contratações, captações… Era montar um time ou desistir. Contrataram uma líder pra cada área que faziam porcamente ou sofrendo… A decisão mexeu nos ganhos, mas trouxe de volta o prazer e brilho perdido que havia no projeto.
Construa a sua engrenagem de inspiração:
“OUTPUT REQUESTS INPUT”, Pra você ter boas ideias, precisa absorver boas ideias. Já parou pra pensar naquilo que te inspira? O que te motiva a ter melhores ideias? O que você tava vendo/lendo/ouvindo 2min antes de ter aquela sua última puta ideia? O Jack Conte começou a listar isso, e achei isso genial. Parece bobo, mas te ajuda a mapear aquilo que alimenta suas ideias. Faça o exercício. Como ele mesmo disse, grandes artistas, são antes de tudo, grandes observadores: Do mundo que os cerca e, o mais difícil, deles mesmos… Quando você entende aquilo que te alimenta, você vai saber de onde montar seu prato quando precisar chegar em uma boa ideia. E não é sobre copiar, é sobre digerir/processar e criar algo novo, a partir das referências que você absorve. E acredite, quanto mais variada a sua “salada”, melhor a sua digestão e melhores serão as suas ideias. Então, vale buscar referências nos lugares mais inusitados. Fuja do seu lugar comum.
Durante essa edição do SXSW percebi que as reflexões mais inspiradoras e provocadoras que tive vieram de filmes e shows que assisti, não de palestras. Aprendi muito ouvindo outros criativos, inovadores, de áreas diferentes das quais atuo. Desde uma reflexão sobre aprender a ser o contraponto de ideias de mentes mais caóticas que a sua em processos criativos colaborativos, que tive vendo o filme “This Much I know to be true” sobre o processo criativo dos gênios Nick Cave e Warren Ellis; a forma como o Gang of Four desafia o tempo (cronológica-cultural-metafórica e literalmente) durante seus shows, quebrando todas expectativas; ou vendo Tony Hawk, em “Until the Wheels Fall Off”, que, por limitações físicas que não o permitiam imitar manobras incríveis dos seus oponentes, passou a criar suas próprias manobras, imprimindo seu estilo e influenciando gerações de skatistas…
Aliás, voltando ao Jack, ele comentou que, quando precisa voltar a se sentir inspirado, ele re-assiste a esse maravilhoso TED Talk do Benjamin Sanders sobre o poder da música clássica (sim, assistam, é inspirador) #FicaAdica
SUBTRACT
Sim, acredite, gente bonita também sofre… e o mesmo também acontece com gente feliz que faz só o que gosta… não é fácil priorizar o que fazer quando você só tá fazendo coisa legal… E chega uma hora em que você percebe que tá desgastado, a equipe tá cansada, vocês tão produzindo muito mas a recompensa tá pouca… ou talvez, estejam se distanciando da meta. Isso aconteceu em um dos projetos SUPER LEGAIS do Jack, Scary Pockets. O escopo do projeto tinha tanta entrega, pra tantos canais, com tantos desdobramentos que aquilo que era a coisa mais legal que estava fazendo DA VIDAAAAAA começava a virar um fardo… Videoclipe pro YouTube, aquecimento no Instagram, chamadinha no Twitter, clipezinho pro TikTok, planejamento pra uma turnê com as músicas do canal… Foi ficando puxado e o time teve que escolher o que deveria parar. Difícil, né? Segundo ele, a luz veio quando resolveram voltar pra essência do projeto, se perguntando “PQ DIABOS COMEÇAMOS ISSO AQUI?” E a resposta foi: “queríamos fazer uns vídeos tocando um som manêro, com artistas que gostamos”.
Ué, mas onde foi que se perderam?
No excesso de desdobramentos.
O plano de estar presente em múltiplas plataformas tinha como objetivo trazer mais inscritos para o canal e isso ajudaria a financiar o projeto. Mas a quantidade de conteúdos produzidos estava gerando mais stress do que inscritos. Avaliaram os números e perceberam que os maiores consumidores de energia, com piores retornos pra meta do projeto eram o TikTok e os Shows ao vivo. Embora gerassem milhares de views nas pílulas de vídeos, na plataforma, o volume de conversão pro canal no YouTube era irrelevante. Ousado, né? Sério, o pouco de músico que eu sou jamais consideraria construir uma carreira musical que desconsiderasse meter umas músicas no TikTok e arrebentar de fazer show… Mas foi essa a decisão que tiveram que tomar pensando no bem maior do projeto e na essência dele. Achei corajoso. Diz ele que agora estão bem mais felizes e o canal segue crescendo.
Acho que vivemos um momento hoje na comunicação onde “é muuuito importante estar presente em todos os pontos de contato do seu público”, mas muitos de nós pecamos em deixar de pensar na relevância que cada peça dessas vai ter pra estratégia do projeto e na vida de quem vai consumi-las. O clássico “Menos é Mais” segue como um guia aqui.
Não se Isole:
O último conselho do Jack está diretamente relacionado ao longo período que passamos isolados, pela pandemia, e como isso afetou a comunidade criativa. Segundo ele, mesmo consumindo toda infinitude de conteúdo que foi gerada nos últimos meses, nos sentimos sozinhos, porque “Conteúdo não é vida, é, apenas, Conteúdo”. A gente consome, em exagero, acreditando que isso esteja saciando um vazio social… mas o vazio continua lá.
Procure se conectar, mesmo que remotamente, com outras pessoas criativas que você admire. Não só pra trocar referências, mas trocar emoções, percepções, inseguranças, fofocas… Eu senti muita falta do “acaso”. Aquele acaso que gera encontros inesperados e deles, ideias. Falar com pessoas do nada, que não combinei, só trombei num corredor ou me ligou, sem avisar. Esse tipo de encontro efêmero, sem saber qual era o assunto, sempre alimentou minha curiosidade e criatividade… Foi duro ficar sem.
Uma atitude muito legal, que mexeu muito comigo, foi uma iniciativa que o Jack e seus amigos Creators tiveram de se reunir, por uma horinha, semanalmente, pra ter essas conversas. Não eram sobre projetos, collabs, fofocas do mercado… eram sobre como estavam se sentindo. E o que amei em tudo isso, e achei extremamente desafiador, é que esses encontros NUNCA FORAM GRAVADOS. Imagina a tentação que não é, pegar esse material com conversas de grandes creators sobre suas angústias, descobertas e pequenas celebrações? Pois é… eles respeitaram a importância da conexão daquele momento e resistiram a tentação de transformar aquilo em conteúdo. Mantiveram os encontros autênticos, sem planejamento e efêmeros.
E você, consegue resistir à tentação de transformar tudo em conteúdo? Apenas viver o momento… essa fala me tocou fundo porque sei o quanto que preciso melhorar nisso. E se conversou com você, me dê a sua mão e vamos nos ajudar a resistir essa tentação 😂
Na real, um dos motivos pelo qual não postei esse artigo antes (e olha que essa palestra rolou no primeiro dia do festival, que já acabou faz uns 10 dias), é que fiquei me policiando pra tentar absorver o que havia de melhor ao meu redor no festival e, depois dele dirigir, com calma, aquilo que ainda fazia sentido pra mim. Resistir a tentação de transformar tudo em conteúdo, antes mesmo de saber se aquilo é “de comer ou de passar no cabelo”. Processar tudo que vi, senti e ouvi… e filtrar aquilo que faz sentido pra mim, no agora. E sim, essa palestra do Jack seguiu sendo um fio condutor de muitas sacações e angústias que vinha sentindo durante os últimos meses…
Enfim, deu pra perceber o quanto essa palestra mexeu com o criativo e o invejoso que habitam em mim, né? Espero que esse recorte aqui também tenha mexido um tantinho com você. Espero que siga sendo essa pessoa criativa que você é, independente do que pensem e independente do que esperem de você. Acredite no seu axé, monte seu Dream Team, Observe aquilo que te inspira, remova aquilo que atrasa e siga conectado com quem te faz bem <3 Se eu estiver nessa sua lista, mesmo sem te conhecer, já ganhei o dia.