Coffee Break #7: devemos temer a Inteligência Artificial?

A Inteligência Artificial guarda inúmeras questões ainda não definidas, decifradas ou sequer exploradas. Será que a humanidade está atrasada em como se preparar para a constante presença de robôs na sociedade?
Coffee Break #7: devemos temer a Inteligência Artificial? Coffee Break #7: devemos temer a Inteligência Artificial?

Será que a humanidade está atrasada em como se preparar para a constante presença de robôs na sociedade?

Coffee Break #7: devemos temer a Inteligência Artificial?
“Coffee and Robots” via Inteligência Artificial no Midjourney

Trilha para a leitura: “My Name Is Human” de Highly Suspect


Aristóteles, em uma de suas maiores contribuições para a filosofia, estabeleceu a ciência da lógica e o silogismo, aperfeiçoando regras universais de raciocínio de modo a auxiliar na busca pelo conhecimento. Segundo ele, se o primeiro passo e o segundo forem verdadeiros, é possível deduzir o terceiro. Por exemplo:

Passo 01: Todos que pensam, logo existem.

Passo 02: Aristóteles pensa.

Passo 03: Portanto, Aristóteles existe.

Tal dedução lógica ofereceu aos novos pensadores formas mais simples e eficientes de se explorar complexas situações.

Porém, quando refletimos sobre um mundo onde os robôs e a inteligência artificial estão cada vez mais onipresentes, seria prudente deduzir daqui há alguns anos que se “todo ser humano pensa” > “um robô pensa” = “um robô é um ser humano”?

A Inteligência Artificial guarda inúmeras questões ainda não definidas, decifradas ou sequer exploradas. Será que a humanidade está atrasada em como se preparar para a constante presença de robôs na sociedade?

Uma notícia: Comunidades de Arte e Bancos de Imagens começam a banir material gerado por IA

Leia aqui: https://updateordie.com/2022/09/22/comunidades-de-arte-e-bancos-de-imagens-comecam-a-proibir-material-gerado-por-ia/

O banimento de artes oriundas de Inteligência Artificial eclodiu nos últimos meses com a banalização dos algoritmos que buscam a mixagem de traços e tons de artistas já existentes, além de outros dados, para a criação de imagens inéditas que imitam com perfeição o toque humano.

“A onda atual de ferramentas de síntese de imagem permite que os usuários digitem uma descrição por escrito (chamada de “prompt”) e recebam uma imagem correspondente, quase como mágica. Os resultados muitas vezes precisam de um ajuste fino, mas com um prompt bem elaborado, os resultados podem imitar com perfeição os trabalhos de artistas humanos com um nível de detalhamento impressionante”. (Update Or Die)

Tal particularidade rendeu um polêmico prêmio ao design Jason M. Allen que se baseou em uma criação no Midjourney, (bot de IA na plataforma Discord) e venceu na feira de arte do Colorado, Estados Unidos, na categoria “artistas digitais emergentes”. O texto que abre este texto foi feito por lá, sob a demanda do termo “Coffee and Robots”.

“Acabou. A inteligência artificial ganhou. Os humanos perderam”. — Jason M. Allen ao The New York Times

Um artigo: ‘Arte está morta’: o polêmico boom de imagens geradas por inteligência artificial

Leia aqui: https://www.bbc.com/portuguese/internacional-62949698

O maior receio da realização das artes via Inteligência Artificial vai além da substituição da mão de obra humana por robôs, mas sim da sua rapidez em assimilar referências e técnica para entregar algo original.

Claro que os artistas se revoltaram por medo de perderem seus empregos, assim como outras dezenas de profissionais, cujas profissões devem passar por uma imensa transformação com a ascensão da tecnologia. Todavia, o fator humano ainda é primordial e seu olhar é único.

Inclusive, como é apresentado no artigo do artista contemporâneo e radialista Bob-and-Roberta-Smith, que já trabalhou em grandes galerias e fará uma instalação artística na Tate Modern de Londres, a inteligência artificial pode ser uma área interessante de atividade artística, na tradição do mash-up. Porém, o mesmo defende que uma legislação precisa ser definida para evitar injustiças — e é isso que está em debate, neste exato momento, no Reino Unido.

O cinema de ontem e de hoje premiaram os espectadores com boas produções sobre o tema. Enquanto alguns autores e criadores se entregaram ao pessimismo após a Revolução Industrial, refletindo um pesadelo em forma de robô, outros ainda acreditam em uma Inteligência Artificial, por vezes empática e auxiliadora, outras um mero instrumento mecânico e sem qualquer rivalidade com os humanos.

Um filme: Metrópolis (Fritz Lang)

Um dos maiores clássicos de todos os tempos, essa ficção científica de 1927, dirigida pelo austríaco Fritz Lang, trouxe a figura de um robô poucos anos após o termo ter sido criado e difundido em 1921.

Coffee Break #7: devemos temer a Inteligência Artificial?

Metrópolis narra um mundo distópico, em 2026, onde a sociedade está dividida em dois grupos: os pensadores e os trabalhadores. Enquanto o primeiro vivia de forma “livre” usufruindo de um mundo tecnológico e cheio de prazeres, o outro morava no subterrâneo, trabalhando de forma mecânica, em condições análogas à escravidão.

Eis que um dia, o filho do criador da cidade Metrópolis, Freder (Gustav Fröhlich), conhece uma moradora do subterrâneo, de nome Maria (Brigitte Helm), e apaixona-se. Parte em busca da jovem e, quando a encontra, descobre que ela assume um papel místico na região, profetizando, inclusive, que em breve um “moderador” surgiria para criar um diálogo entre os grupos.

O criador e governante de Metrópolis é Joh Frederse. Ao vigiar o filho, que estava apresentando um comportamento suspeito, depara-se com o movimento em torno de Maria, preocupando-se com uma iminente revolta. Joh vai atrás de seu braço direito, o inventor Rotwang (Rudolf Klein-Rogge), para pedir ajuda. Lá ele conhece a “máquina-humana” Hel, criação baseada em um antigo amor dos dois homens. Joh, impressionado pela inovação, pede para que ela seja ajustada e tenha a forma e semelhança de Maria, a fim de confundir os proletariados.

Essa pequena síntese do filme está longe de captar suas complexas nuances, as camadas religiosas e sociais que fazem a obra ser influente até hoje. A ideia aqui é explorar a figura de Hel/Maria. A personagem robótica assume “o complexo de Frankenstein”, onde a figura criada pelo cientista, na obra de Mary Shelley, de 1818, deixa um rastro de equívocos por onde anda. Desde então, robôs foram retratados com o mesmo temor.

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HEL: distração para as massas.

Porém, Hel não se resume apenas a isso. Trata-se de uma figura feita com uma missão: seduzir e distrair. O filme retrata a “máquina-humana” com um potencial arrebatador de domar multidões, destilando fake news, além de usar uma forma atraente, humana e com traços mitológicos para conquistar e se fazer ouvida.

Hel hipnotiza com a tentação do novo, a mordida da maçã, o discurso de pertencer a algo, — uma comunidade em que todos aceitam a seguir sem nem medir as consequências. Atualmente, o papel da IA está muito além da necessidade industrial, atrelada a vários dispositivos que a sociedade adotou para ter “mais praticidade”. Hel poderia muito bem ser uma criação de qualquer empresa atual, personificando o desejo, a tecnologia e a persona de divindade.

Filme disponível no Youtube.

Trailer aqui.

Um filme: Frank e o Robô (Jake Schreier)

Dirigida pelo norte-americano Jake Schreier, a história apresenta Frank (Frank Langella), um assaltante aposentado que possui dois filhos adultos, interpretados por James Marsden e Liv Tylor. Ambos estão preocupados com o fato do pai não conseguir mais viver sozinho e ainda está com a memória comprometida.

Como não encontram tempo para conviver com pai, acabam decidindo interná-lo em um asilo, mas mudam de ideia ao descobrirem uma nova alternativa: comprarem um robô que anda e fala, sendo programado para ajudar no desenvolvimento da saúde mental e física do paciente.

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Frank e o Robô: a improvável amizade acontece.

Deliciosamente engraçado, o filme ainda apresenta uma boa analogia entre o ser humano e a máquina, pois de uma forma semelhante, o robô pode perder sua memória a qualquer momento — trazendo essa particularidade à tona e aumentando a empatia de Frank, cujo receio é legítimo por conta da idade avançada. A improvável companhia vai dando lugar a uma relação de aprendizado, lealdade e, por que não, amizade. Para o terror dos filhos, o Robô acaba fazendo mais sentido para Frank que suas próprias presenças.

Na obra é possível perceber que o escritor russo Isaac Asimov, autor de O Homem Bicentenário e Eu, Robô, foi a referência com sua percepção mais otimista em relação aos robôs e à inteligência artificial. Asimov é criador das três leis da robótica, as quais visavam evitar o “complexo de Frankenstein”; bastava uma programação efetiva e regras simples e, ligeiramente, paradoxais. São elas:

1. Um robô não pode ferir um humano ou permitir que um humano sofra algum mal

2. Os robôs devem obedecer às ordens dos humanos, exceto nos casos em que essas ordens entrem em conflito com a primeira lei

3. Um robô deve proteger sua própria existência, desde que não entre em conflito com as leis anteriores.

Filme disponível na HBO MAX.

Trailer aqui.

Um Filme: Oxigênio (Alexandre Aja)

Coffee Break #7: devemos temer a Inteligência Artificial?
E se a IA fosse sua única chance para sobreviver?

E se a sua vida estivesse em perigo e seu contato fosse apenas com uma inteligência artificial? Esse é o mote do filme Oxigênio, cuja história se passa grande parte do tempo dentro de uma câmara criogênica, onde uma mulher (Mélanie Laurent), precisa agir com precisão e calma para conseguir escapar. Ela tem como principal contato o MILO, uma inteligência artificial, que nada mais é que uma evolução dos assistentes de voz conhecidos atualmente. Quanto mais o tempo passa, mais desaparece o oxigênio e mais diminuem as chances de sair dali com vida.

O filme, dirigido pelo diretor francês Alexandre Aja, traz a percepção de um robô no seu formato mais genuíno: a servidão programada não dá margem para qualquer caminho que o faça sair de sua missão original. Ou seja, a vida da mulher não é mais importante do que o objetivo que ele foi programado a realizar. Porém, a perspicácia humana em trabalho conjunto com a IA, pode levar a soluções inimagináveis. 

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MILO, que sou eu?

Esqueça a paranoia da IA HAL 9000, no filme 2001: Uma Odisseia no Espaço, MILO aqui está mais para uma Alexa ou Samantha (voz de Scarlett Johansson, no filme Ela). Os assistentes até podem gerar um bom diálogo e soluções, mas a formulação da pergunta precisa ser a mais assertiva possível. Não é à toa que MILO é uma das grandes forças narrativas do filme, um personagem com peso de antagonista e que oferece gatilhos diferentes em diversos momentos da história, esclarece alguns “segredos” e oferece várias reviravoltas, voluntariamente ou não.

Filme disponível na NETFLIX.

Trailer aqui.


Seja na cultura cinematográfica ou na própria realidade, a Inteligência Artificial oferece munição para muitas interpretações, discussões e caminhos, sendo ela para soluções ou não. Se monstro ou parceiro, uma coisa é certa: ainda ouviremos falar muito sobre ela.

Até a próxima!

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