Breve Festival 2023 muda formato e faz excelente edição

Festival transforma o Mineirão em um palco com misturas interessantes.
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Abrir um festival é uma tarefa difícil. O público ainda não chegou completamente, o dia está muito claro e o som ainda precisa de forma. Mas, Luedji Luna, a primeira atração do Breve Festival, que aconteceu em Belo Horizonte, no sábado (22), amansou o palco. A leveza de “Blue”, a primeira canção do setlist, seguida do molejo ótimo da banda em “Salto”, antecipou o entardecer. Ambas as músicas são do último trabalho da artista, a versão deluxe de “Bom Mesmo é Estar Debaixo D’água”. 

Alceu Valença entrou no carro blindado chamado “Pagode Russo” e engatilhou “Coração Bobo”. Com o tempo curto, ele fez um show mais acelerado, sem pausa pra causo. Jogou a bola para o alto com a força que a gente já se acostumou a ver. 

João Gomes conseguiria cortar? Quando foi anunciado, eu, na minha infinita ignorância, achei o nome mais deslocado do lineup. O artista não só tem uma monumental presença de palco, como mantém sua voz grave, ora rouca, ora abafada, sempre afinada. Foi um baita show. E a estranheza de ter Don L. e Gilsons como convidados foi dissolvida assim que a banda puxou “Várias Queixas” em piseiro. “A gente se conheceu hoje”, confessou Francisco Gil. O casamento arranjado não ficou evidente. João Gomes virou um ímã e puxou “Beira da Piscina”, do Don L., pra dentro do seu universo. “Eu amo hip hop. Mandei mensagem para esse cara em 2017 no instagram e hoje estou cantando com ele”.

Foi um momento tão surpreendente, onde as linhas temporais do passado se cruzaram com a modernidade do agora, que botou a apresentação entre as melhores junções que já passaram pelo Breve Festival. Os três artistas, mesmo improvisando, entraram com a certeza de que daria tudo certo. “Antes de começar o Alceu foi lá no camarim e disse: Deus abençõe o show do vocês”. 

Sozinho de novo, João Gomes fez “Dengo” beirando ao axé; transformou “Ana Júlia”, dos Los Hermanos, em ijexá; repetiu “Morena Tropicana”, de Alceu Valença; e mandou sua versão de “Amado”, de Vanessa da Mata, com muito charme. O público devolveu essa aposta do festival cantando a miscelânea com pulso. 

Black Alien e FCB vieram em seguida.”Área 51″ não deixou a temperatura cair. Bom show, mas foi uma pena não ter revisto o rapper com o Planet Hemp, umas horas mais tarde. 

Eu não sou do futebol. Pra mim, só o Maracanã e o Mineirão foram lugares que ultrapassaram o gramado com fatos que entraram pra história mundial: a derrota pro Uruguai, em 1950, no final da copa. E o 7 a 1 pra Alemanha, em 2014. 

É um estádio icônico. Alcione, uma rainha, se emocionou em boa parte da sua apresentação ao ver uma plateia tão jovem ecoando seu repertório pelo Mineirão. Liniker, que entrou em seguida, constatou de cara: “É a primeira vez que canto em um estádio com tanta gente!”

Alcione, puxando “Não deixa o Samba morrer” e depois Liniker com “Baby 95”, criou uma espécie de espelho musical. Dois vozeirões, duas artistas que beberam do soul. Liniker canta como se todos estivéssemos apaixonados, sentindo o mesmo transe por ter a companhia perfeita. 

Com esta sequência, eu, na minha infinita ignorância, não segurei a língua: a Joss Stone vai ter que suar a camisa hoje, hein?

Não teve. A única atração internacional fez um medley sensacional de “You Had Me”, “Free Me”, “Bad Habit”, “You Got the Love” e “Super Duper Love” sem dar espaço pro fôlego. 

Todo mundo já espera um “obrigado”, “um valeu” com aquele sotaque inglês. Joss Stone falou um textão em ótimo português. E não desarmou o sorriso. Ela ainda se surpreendeu com o estádio cantando “Right to Be Wrong” em outro belo momento da noite. 

Se o Breve acabasse ali, já teria sido um dos grandes festivais de 2023 pra mim. 

Só que a headliner era a Ludmilla. E aí o Mineirão virou final de copa do mundo. Mesmo gripada, a artista impôs um ritmo furioso: foi do funk ao pagode, do romântico ao samba com esperteza de pantera. Se sua nova aposta no trap com “Sou Má” não me apaixona, o Numanice é uma beleza. Incrível como Ludmilla é criativa, flexível e passeia por todos esses estilos com unidade.

Teria sido melhor ver o Planet Hemp seguido do Black Allien e Péricles fechar o festival depois da Ludmilla? Teria. Mas, mesmo cortando essa onda, o pesadíssimo som do grupo não apagou a ponta que a cantora de “Onda Diferente” deixou acesa. 

Perícles, já perto das três da manhã, transformou o Mineirão numa filial da Sapucaí. Fez uma grande apresentação. Lindo vê-lo entrar no circuito dos festivais pela porta da frente.  

Provavelmente, o show do Kiss, que aconteceu um dia antes na esplanada, empurrou o Breve Festival para dentro do estádio e dificultou uma organização mais arrojada, além de ter espalhado o lineup em um palco só e cancelado algumas atrações. 

Ao ver todos esses artistas em pleno Mineirão, o ranço de quem reclamou deve ter passado. Porque é a reunião de bons nomes, é a chance de ver junções surpreendentes e apresentações tão poderosas que justificam esse tipo de evento. Tomara que os demais festivais também se arrisquem assim, botem outros nomes como Jorge Aragão, Diogo Nogueira, MV Bill, Lenine, Fagner, Norah Jones, D’Angelo… Porque nesse ponto, a edição 2023 do Breve Festival foi hit.

Bom Mesmo foi estar no Mineirão. 

 

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