Se você mora em uma grande cidade brasileira é bem provável que já esteja familiarizado com as lojas Oxxo. Em formato de minimercados, elas se espalharam por diversos locais com um ritmo de 1 nova loja por dia, segundo próprio comunicado oficial da empresa, totalizando mais de 300 unidades no país (na américa latina chegam a mais de 19 mil).
Apesar de eu mesmo já ter visto várias delas espalhas pela cidade de São Paulo, um fato me chamou a atenção durante o mês passado enquanto estava caminhando por uma rua e me deparei com mais um dos inúmeros estabelecimentos: mas, dessa vez, havia uma placa logo na porta de entrada dizendo ‘Se fala “Ó-quis-sô” e tá sempre próximo’ substituindo a anterior “Mercado aberto 24h por dia”.
Essa nova frase fez despertar meu lado marketeiro, e imediatamente tentei entender o motivo por trás dessa ação: qual o ganho real de uma marca entrante no Brasil em destacar sua pronúncia originalmente mexicana? Qual o valor dessa marca para que ela esteja educando seus consumidores (aqui é muito comum ouvirmos as pessoas chamarem as lojas de “Ochô”) a forma correta de pronunciar seu nome?
A rede de minimercado foi trazida ao Brasil pela Raízen, empresa de energia que é dona, dentre outras marcas, da Shell. A Raízen também tem como sócia da Oxxo a FEMSA (maior engarrafadora de Coca-Cola do mundo em volume de vendas).
A relação aqui fica clara: com o know-how de distribuição de produtos alimentícios das lojas nos postos Shell, chamadas de Shell Select, a logística foi adaptada para atender a rede de lojas Oxxo: o aproveitamento das operações facilitou a expansão do negócio.
A estratégia da empresa parece em dia, mas qual o posicionamento por trás das placas mostrando a forma correta de pronúncia? Parece um investimento incomum e um pesadelo para o profissional a frente do branding da marca.
Continuando caminhada pela mesma rua citada, me deparei com outra loja, essa já a mais tempo presente no país e extremamente familiar aos brasileiros: o Méqui (repare que aqui eu não me referi a loja Mc Donald’s, e sim ao nome presente na fachada do restaurante fast-food).
A mudança dos nomes estampados nas fachadas das lojas não é novidade: essa estratégia da marca está presente desde meados de 2019 e contempla a alteração do tradicional “Mc Donald’s” por nomes informais pronunciados por milhões de brasileiros todos os dias como “Méquizinho”, “Mecôso”, “Mecdoninho”, “Mczêra”, “Mecão” ou simplesmente “Méqui”.
João Branco, ex-diretor de marketing do Méqui no Brasil, divulgou na época, que a iniciativa tinha como objetivo “celebrar a relação das pessoas com a marca”. A mudança da marca não é uma exclusividade brasileira: no passado a rede de fast-food já havia trocado parte de seus letreiros na Austrália para “Macca’s”, apelido pelo qual a rede é conhecida por lá.
Já no Canadá o logo dos arcos dourados recebeu uma alteração definitiva: uma folha de maple, símbolo local, bem no centro do logo.
Mas a ação no Brasil não parou por ai: além das mudanças dos nomes de algumas unidades, a empresa também incentivou os consumidores a contarem como chamam a marca. Os nomes mais criativos foram escolhidos pela equipe de marketing do Mc Donald’s para estamparem fachadas, embalagens e anúncios.
Alguns anos depois, em 2021, foi lançada a campanha ‘Méquizice’ que desdobrou a personalização da relação dos consumidores com a marca: dessa vez visando tornar formas de consumo inusitadas de produtos do Méqui em comportamentos normais, como misturar batatas fritas com milk-shake ou pedir todos os molhos para criar uma mistura única e aplicá-la em um produto (como um lanche).
“Nos últimos dois anos, temos feito movimentos importantes para mostrar aos clientes que queremos estar cada vez mais próximos. Começamos adotando o apelido Méqui e mudando nossas fachadas, apresentamos o conceito de Méquizice e seguimos muito atentos às oportunidades de ampliarmos nossa presença nas mais diferentes ocasiões de consumo” diz João Branco.
Ponderar sobre como uma das marcas mais conhecidas pelos brasileiros explorou formas distintas de se aproximar de seu consumidor, alterando um dos seus ativos mais importantes, me fez pensar que talvez a Oxxo também tivesse uma campanha por trás da aplicação das placas nas fachadas. Deveria haver algum tipo de planejamento e razão por trás da ação.
E eu estava certo: depois de algum tempo me deparei com uma campanha por parte da Oxxo lançado no início desse ano abordando a questão da pronúncia do nome da empresa e marcando a estreia das infames placas. Na campanha em si, a mensagem foi abordada de forma mais aberta e pessoal, reforçando que o consumidor ‘pode falar como quiser’ o nome Oxxo. Existem exemplos de consumidores falando ‘Ochô’, ‘Ócho’, ‘Ochó’, ‘Oxi’ de forma bem inusitada e corriqueira.
Segundo o coordenador do Núcleo de Varejo e Retail Lab da ESPM (Escola Superior de Propaganda e Marketing), Ricardo Pastore, mais importante do que explicar a pronúncia do nome de uma empresa é mostrar como o consumidor será recebido por ela.
E isso, de forma clara, a campanha em questão demonstra. Ele ainda reforça que “é normal” o esforço da empresa em explicar a pronúncia do nome por se tratar de uma marca global e estrangeira, mas não recomenda que seja gasto muito tempo com isso: “É melhor explicar o conceito da loja do que o nome”.
“O seu intuito [da campanha] é sanar uma dúvida recorrente e natural de seus consumidores desde a chegada da marca no Brasil, observada, principalmente, no ambiente digital. A campanha terá continuidade com reforço digital animado e divertido ao longo dos próximos meses, conversando com o cliente e entrando no cotidiano das redes sociais.”
Oxxo, em nota enviada sobre pronúncia da marca.
Para os clientes que viram a campanha, a inclusão da placa ganha outro significado (uma vez que o funcionário da Oxxo presente nela não precisa mais frisar a forma correta da pronúncia), porém para os clientes que se depararam apenas com a placa ao entrarem em uma loja, parece um esforço em vão em relação a forma correta de dicção. De qualquer forma, as redes sociais reverberaram a presença das novas placas com diversos memes:
Segundo Rodrigo Patuzzo, CEO do Grupo Nós (responsável pelas marcas Oxxo e Shell Select), a Oxxo recebe os comentários a respeito do nome da marca com bom humor. “Nós brincamos muito com isso” reforça ele, por meio das redes sociais que tem “tem uma série de postagens que explicam como se fala Oxxo”.
Em um momento em que os minimercados estão em constante expansão pelo país, parece que a estratégia adotada pela empresa vai de encontro com o posicionamento global em reforçar uma marca única, além de ampliar o awareness a respeito do tema por meio das diversas interações nas redes sociais.
O que o case do Méqui nos mostra, entretanto, é que talvez a segmentação por região possa ser uma estratégia global ainda mais eficiente ao colocar no centro da discussão justamente o consumidor. Resta aguardarmos os desdobramentos das campanhas da Oxxo para entendermos como tema será abordado continuamente.
https://www.youtube.com/watch?v=c_LmICT8mVs