No meu artigo anterior aqui no Update or Die, escrevi que estamos vivendo uma transição de eras, com transformações em todas as esferas da sociedade. O mundo do trabalho, por exemplo, tem sido muito impactado em função da substituição de um modelo que vem da Revolução Industrial – baseado em operações em que funcionários estavam dentro de escritórios, lojas e fábricas das organizações, trabalhando como empregados – por um novo sistema, que está apenas no início, chamado por especialistas internacionais de open talent economy.
Gostaria de continuar essa reflexão sobre mudanças e vida profissional, mas agora a partir de uma perspectiva existencial. Isso porque a pandemia, esta tempestade global sem precedentes para nossa geração, é um convite para, a partir de uma visão holística, repensarmos atitudes e crenças, avaliarmos o que realmente importa e, assim, refletirmos também sobre a carreira e o nosso lugar no mundo do trabalho.
É realmente importante que esse exercício seja feito de forma holística porque está tudo conectado. Vida pessoal, carreira, educação, relações sociais e familiares: todas essas esferas se relacionam e interferem umas nas outras. Neste sentido, gosto muito da visão da Sandra Chemin, fundadora da Futureyou. “O mais importante não são as novas profissões e as que vão desaparecer, porque isso vai mudar o tempo todo. Hoje, o fundamental é a habilidade de desenhar nossa vida”, disse ela nesta entrevista. “A gente usou muita inovação nos negócios, e agora está na hora de usar para inovar na nossa vida”.
Para aprender a habilidade de desenhar a vida, o passo inicial é escolher o estilo de vida que se deseja ter para depois buscar o trabalho que melhor se encaixa, diz Sandra na mesma entrevista. Considero esse ponto muito importante porque subverte a lógica com a qual a nossa sociedade se acostumou: em vez de vivermos para o trabalho, é o trabalho que deve servir aos nossos propósitos pessoais e fazer parte de um projeto de vida.
Mas a grande pergunta é: como fazer isso? Como desenhar a própria vida? Quem nos oferece uma resposta interessante são dois professores da Stanford University. Referências nas áreas de design e inovação no Vale do Silício, Bill Burnett e Dave Evans são autores de O Design da sua vida – como criar uma vida boa e feliz. A obra é a versão em livro de um dos cursos mais disputados em Stanford. No centro do pensamento dos autores, está a ideia de que os mesmos princípios usados pelos designers para inovar e resolver problemas podem ser utilizados para projetar e desenvolver a carreira e a vida de uma maneira geral. O design thinking surge, assim, como um instrumento poderoso de desenvolvimento pessoal. “Design não existe apenas para você criar coisas bacanas, como computadores e Ferraris; ele também funciona para criar uma vida bacana”, escrevem Burnett e Evans no livro. “Uma vida bem projetada é uma vida geradora; é constantemente criativa, produtiva, dinâmica, está sempre evoluindo, e as surpresas são sempre possíveis”.
Pensar como um designer
Para projetar a vida, os professores explicam que o ponto de partida é aprender a pensar como um designer. E designers não pensam no caminho que vão seguir, eles criam o caminho. Isso significa que não se deve ficar sonhando com um mundo que nada tem a ver com sua realidade, mas sim construir coisas – protótipos –, fazer experiências e “se divertir ao longo do processo”. E para aprender a desenhar a vida, os autores listam cinco atitudes simples, mas que podem fazer a diferença:
01. Seja curioso
A curiosidade permite enxergar oportunidades em todos os lugares. É um convite a explorar novos caminhos e torna a jornada mais prazerosa.
02. Experimente
Em vez de pensarem no que fazer, os designers experimentam e testam as coisas. Criam protótipos, erram e tentam de novo até encontrarem a melhor solução. “Os designers aceitam a mudança. Eles não são apegados a um objetivo em particular, porque estão sempre focados no que irá acontecer a seguir e não em qual será o resultado final”, dizem os autores.
03. Reformule os problemas
A reformulação é como os designers driblam os obstáculos. Ela mantém o foco nos problemas certos. “O design de vida envolve reformulações principais que permitem que você dê um passo atrás, examine seus vieses e desenvolva novos espaços de solução”.
04. Saiba que é um processo
Às vezes a vida pode ficar confusa, e os erros vão acontecer. Assim, projetos podem dar errado, o que exige dar alguns passos atrás de vez em quando e abandonar aquela ideia que parecia sensacional, mas que não funcionou. Pensar como um designer significa aprender a ter “consciência do processo”, dizem Burnett e Evans. “O design de vida é uma jornada; liberte-se da meta final, concentre-se no processo, e veja o que acontece a seguir”.
05. Peça ajuda
Colaboração radical. Para os professores, essa talvez seja a principal habilidade a ser cultivada. Os melhores designers sabem que pedir ajuda, colaborar e trocar experiências é a trilha mais curta para resolver um problema. “O design é um processo colaborativo e muitas das melhores ideias virão de outras pessoas”.
Ao refletir sobre essas cinco habilidades – e também sobre todo o processo de desenhar a vida –, fica evidente a importância de adotarmos uma postura de abertura diante da vida. Abertura à mudança, a aprender sempre, a abraçar novas ideias e conceitos. E também partir para a ação e construir o próprio caminho, sabendo que, como nos mostram os designers, a jornada da vida é feita de etapas. Cada uma delas com seus erros, acertos e muitas, muitas descobertas.
Karina, excelente texto com conteúdo e clareza na mensagem. Parabéns!
Muito obrigada Batista!