O gráfico é de mídia, mas serve para refletir sobre a criatividade em propaganda. Ainda cabe?

Sim, a gente sabe que as mídias tradicionais estão sendo trocadas pelas digitais. Mas nem sempre temos noção das inclinações das curvas. E muito menos o que isso representa para a criatividade publicitária.
O gráfico é de mídia, mas serve para refletir sobre a criatividade em propaganda. Ainda cabe? O gráfico é de mídia, mas serve para refletir sobre a criatividade em propaganda. Ainda cabe?

O gráfico abaixo, criado pela Raconteur (que não é aquela banda do Jack White), mostra as curvas “estilo pandemia” no investimento global dos anunciantes entre 1980 e 2020. Principalmente nas últimas duas décadas. Basicamente, o que já sabíamos: uma troca das mídias tradicionais como jornais, revistas e comerciais na TV por mídias digitais (search e redes sociais).

O que não está explícito no gráfico é o que isso significa no teor dessa comunicação que agora acontece online. Algo que, como profissional de criação, não posso deixar de refletir. E acho que talvez seja algo que você também tenha reparado, especialmente se você tem mais do que 30 anos de idade e/ou mais de 20 anos de profissão.

O gráfico é de mídia, mas serve para refletir sobre a criatividade em propaganda. Ainda cabe?

Posso ir direto ao ponto? Na bucha? Bom, acho que estamos diante da última pá de cal do que foi um dia a indústria da publicidade, do ponto de vista da criatividade. Se nos meios dominantes, os digitais, ainda tem cara de convidado penetra, nos meios tradicionais é de cair no chão e chorar. Pessoalmente não tenho estrutura emocional para ver um break comercial na TV, em qualquer canal em qualquer horário. Claro que ainda tem um ou outro que se salva, mas de modo geral os comerciais viraram caricaturas que tentam emular o ambiente e a linguagem digital.

A propaganda parece ter se transformado em uma espécie de mala direta anabolizada, daquelas que eram feitas cheias de formuletas (no primeiro parágrafo fale assim, no segundo fale assado, no terceiro insira imagem, etc etc), testemunhais sem fim (uma estratégia de décadas atrás, mas que agora foi rebatizada como “influence mkt”).

Sim, eu sei que o mundo evolui e que as coisas mudam. Pode apostar, faz 17 anos que montei um negócio inteiro baseado nessa premissa da mudança e na importância de se adaptar a elas, sob o risco de ser exterminado. É o que tenho repetido em forma de referências, desde então. Mas também sei que evolução nem sempre significa melhoria imediata, pelo menos em certos aspectos. Em propaganda, acho que melhoramos nossa capacidade de nos agarrarmos aos pés dos consumidores, mas pioramos muito em uma determinada estratégia que usávamos com muita frequência, que era a criatividade. Criatividade funcional, para alcançar mais e… melhor. Para estimular consumo mas também para construir marca através de engajamento. Hoje, parece bastar um relatório de entregas cheeeeeeio de métricas.

Em tempo: acredito que não haja uma relação direta, de causa e efeito, entre os meios e a falta de criatividade vigente. Infelizmente, acho que o problema está no despreparo na elaboração e no entendimento das engrenagens do consumo, essas sim as inabaláveis e verdadeiras métricas do engajamento. Enquanto a publicidade seguir insistindo em Ivete Sangalo (nada contra ela, sou fã), Anitta (bom, essa eu já prefiro não me manifestar), youtubers, Instagramers… ou será que a os publicitários acham mesmo que essa “credibilidade” vai durar ainda muito tempo? O Marketing de influência tem um potencial enorme e é um dos mais fascinantes, desde que seja AUTÊNTICO e não com nano celebridades compradas com samples, venda de likes e seguidores, conteúdo requentado da gringa, enfim, toda uma palhaçada que muito anunciante nem sabe que existe.

Enfim, o tiozão da criação vai se recolher, desculpe, é que me dá uma tristeza danada ver para onde se encaminha nossa cultura – e nossa cultura POP inclusive, por conta de números e fórmulas que infelizmente estão atraindo esses investimento todos. Pessoas criativas por natureza, que antes naturalmente seguiam para a indústria da publicidade, hoje já migram para outras áreas. É fato. O que denota um bom profissional de publicidade ou de marketing hoje é mais baseado em formuletas e regras, do que em pensamento inovador. Aliás, esse é o ponto central que tenho usado para desafiar meus paradigmas: será que criatividade e inovação ainda são tão importantes como eram antes? Talvez não. Talvez mais do que nunca.

Cabe repetir, para encerrar: nada de errado na evolução dos meios, porque isso quem dita são os consumidores. Só me entristece o nível do que anda circulando por esses novos meios, em detrimento de mensagens que poderiam ser bem mais efetivas e duradouras no mecanismo do consumo. Se você é um profissional de marketing, te convido a pensar sobre isso. Nosso espaço está e estará sempre aberto para esta reflexão e debate.

2 comments
  1. Estava pensando sobre isso esses dias. Até busquei no Youtube um compilado daquele programa “Intervalo” (não me recordo do canal), para matar saudade dos bons filmes publicitários com pouco ou nenhum recurso em computação gráfica. Quando pegava uma revista Veja nas mãos, primeiro foleava para ver todos os anúncios para depois começar a ler as matérias. Bons tempos. Infelizmente essas propagandas, assim como seus criadores, estão se tornando literalmente dinossauros. Parabéns pela matéria Wagner.

  2. É decepcionante olhar as propagandas brasileiras antigamente com gênios criativos que colocaram o Brasil entre os melhores em criatividade com campanhas impensáveis e comparar com hoje com todo AD seguindo a mesma estrutura e prometendo as mesmas coisas ao público.

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