Já faz mais de 15 anos desde que Kevin Roberts lançou o best-seller Lovemarks. Na época, ele alegava que a receita do sucesso para marcas era criar “fidelidade além da razão” ao provocar duas emoções básicas no consumidor: amor e respeito.
Obviamente, de lá pra cá muita coisa mudou, especialmente para o marketing. Com cada vez mais pessoas produzindo conteúdo digital de ótima qualidade, criamos um ambiente no qual a informação é abundante, mas a atenção é escassa. Muitos dizem que este excesso de conteúdo é o responsável por tornar ainda mais difícil a tarefa de criar uma comunicação que traga resultados aos anunciantes. Na minha visão, isso é apenas parte do problema. O que enfrentamos como profissionais de marketing hoje é bem maior que apenas uma crise de atenção.
Para explicar o porquê, vou retornar à teoria das marcas amadas além da razão. O próprio conceito de fidelidade de marca, central para sustentar uma lovemark, já foi derrubado por inúmeros estudos. A maioria destes explica que o número de consumidores “fiéis” à marcas de quase todas as categorias é percentualmente pequeno e insuficiente para sustentar vendas e marketshare. Fidelidade de marca simplesmente não existe. Esta observação já era possível de ser feita em um mundo pré-digital e tem se tornado ainda mais forte.
A relação das pessoas com as marcas deixou de ser baseada em promessas de amor. As pessoas se interessam por atitudes e comprovações reais e diárias das intenções da marca. O consumidor deixa de ser um apaixonado buscando pelo contato com seu amado, para tornar-se um crush que avisa aos pretendentes que não será facilmente conquistado:
“me conte sua visão de mundo, aja para demonstrar que suas intenções são verdadeiras, torne minha vida mais fácil e quem sabe – eu disse quem sabe – serei seu”.
As lovemarks precisam acompanhar o zeitgeist. Talvez, elas precisem evoluir para Crushmarks.
Ao contrário das Lovemarks, as Crushmarks entendem que as relações são passageiras e que, por isso, precisam manter o encantamento sempre em alta. Elas não cobram fidelidade ou respeito. Elas oferecem valor tangível nas transações comerciais e conquistam o respeito das pessoas através de seu propósito e de suas atitudes.
Para exemplificar isso, gosto de usar a metáfora do laço. Marcas fortes são como laços – elas não são nós cegos. Mesmo que tenha sido difícil de criá-los, os laços são frágeis e qualquer imprevisto pode desatá-los. Por isso, o trabalho de um gestor de marca é estar constantemente cuidando para manter o laço de pé. Estudando novas formas de encantar, emocionar, entreter, entregar utilidade, inovar, ser melhor que ontem e ainda manter coerência entre todos estes pontos.
Todo mundo que já esteve em um relacionamento suficientemente longo sabe que quando tudo vai bem é onde mora o real perigo. Não existe nada mais mortal do que acreditar que o amor do outro é para sempre. E, talvez, seja por isso que tantas lovemarks do passado perderam espaço para os crushes que chegaram oferecendo bem mais do que promessas. No marketing e na vida, o amor nem sempre é o suficiente.