Nas trincheiras francesas da primeira guerra mundial, o coronel Dax lidera seus homens em uma missão suicida, ordenada pelo general Mireau: tomar uma colina sob o domínio dos alemães.
A falha do ataque, contudo, é escondida atrás de uma burocracia militar. Ao não ver a tropa partindo pro campo, Mireau condena os soldados por covardia. Uma Corte é estabelecida para julgar três soldados, cuja sentença é execução.
“Glória Feita de Sangue” trata de um dos temas que o diretor, Stanley Kubrick, mais explorou. Da raiz estratégica das batalhas em Spartacus à ameaça nuclear na comédia, “Doutor Fantástico”, e a loucura de “Nascido Para Matar”, vemos faces diferentes da guerra, espelhando o que “Glória Feita de Sangue” começou: a falta de sentido na luta, a baixeza dos motivos para justificá-la e, principalmente, a ironia para enxergar os comportamentos humanos diante de situações puramente instintivas, julgados por uma ótica moral.
Por exemplo, logo após a condenação dos três soldados escolhidos como bode expiatório, os generais dão um baile.
Adiante, quando os condenados estão frente ao pelotão de fuzilamento, a imagem é de uma crucificação. Um dos soldados está desacordado – não ouve. O outro, o mais inocente dos três, com os olhos vendados – não vê. E o terceiro, que guarda um fato importante sobre seu superior, Tenente Roget, que aconteceu no decorrer do filme, não fala. O modo como cada soldado se relaciona com o padre responsável por tomar a confissão antes da morte é genial!
Outra imagem poderosa e irônica acontece logo após a condenação, quando os soldados se reúnem pra beber e cantar. Aí surge a única mulher do elenco, uma refém alemã. Quando ela diz algumas palavras, os soldados zombam: “diga em uma língua civilizada”. Só pra constar, o filme é sobre um pelotão francês, mas falado em inglês. Pode apostar que pro perfeccionista Kubrick esse diálogo não foi de graça…
Nos filmes seguintes do diretor, esse olhar instantâneo, pra não dizer debochado, sobre como os homens retornam à sua origem animal, é desenvolvido de maneira cada vez mais crítica e suntuosa. Mas é preciso destacar a maravilha técnica desse trabalho. (Quem gostou de “1917”, veja logo)
A forma também foi um método para ele desenvolver suas histórias. Neste filme de inacreditáveis 88 minutos, muita coisa acontece. E sempre com sutileza, com precisão e imagens poderosas para jogar você naquela trincheira e te fazer questionar se, na guerra, há mesmo diferença entre coragem e covardia.
Para Stanley Kubrick, dá pra gente refletir que ser corajoso não é empunhar uma arma e enfrentar uma chuva de balas. A bravura é ocasional porque a decisão sobre ser herói ou inimigo não é de quem luta de fato. A guerra é só um jogo imoral entre duas partes iguais.
Glória Feita de Sangue (Paths of Glory, 1957)
Onde assistir: TelecinePlay