Convergência, quando se fala de contexto digital, já é uma palavra batida, mas ainda é boa para explicar os movimentos da indústria da música, entretenimento e de tecnologia, especialmente redes sociais. Ao chamar artistas para a sala de desenvolvimento de produtos, para pensar múltiplas narrativas que extrapolam o
território da música, do estúdio, do licenciamento de produto e, principalmente, da apropriação do conteúdo, tudo converge, se encontra, se mistura. E é
necessário entender todos esses movimentos conforme novas redes sociais vão surgindo e os usuários criando conteúdos de acordo com as possibilidades das plataformas.
A música, em especial, é pioneira no enfrentamento de desafios que surgem com o desenvolvimento das tecnologias. Muito antes da Netflix deixar de alugar
filmes físicos (fitas e DVDs, veja só) e desafiar a indústria do cinema e da televisão com o streaming, o Napster, um software pioneiro de compartilhamento de música, obrigou a indústria da música a mexer no seu modelo de negócios e abraçar a economia digital.
Mas não é apenas a crise causada pela revolução digital que fez com que a produção e distribuição musical precisasse ser revista. A pandemia pela qual
passamos, e que, por segurança sanitária, repele qualquer tipo de aglomeração, abalou toda cadeia da música, dos pequenos aos grandes, dos trabalhadores de palco aos grandes produtores e músicos.
No podcast 22000 pés, que produzo e apresento, recebi Coy Freitas, um grande amigo, curador e diretor artístico, a mente por trás de alguns dos maiores
festivais de música do país, além das lives – uma febre durante o contexto pandêmico -, o retorno de shows a um formato híbrido é uma realidade, não sendo possível hoje conceber um projeto futuro que esteja somente no presencial. Vai ter que estar no streaming, vai ter que migrar. Mas mais do que isso: teremos cada vez mais formas de consumir música. E é aqui que as redes sociais e novas plataformas acabam assumindo protagonismo.
Há uma estatística que aponta que cerca de metade da música escutada via internet é ouvida no YouTube. O que não chega a surpreender, já que o
YouTube é o segundo endereço na web mais acessado do Brasil há anos e o conteúdo musical sempre teve grande importância. E o desenvolvimento de uma
ferramenta própria – paga – de música se beneficia disso ao fazer circular vídeos de música das mais diversas origens, licenciadas ou não.
Mas essa é uma apropriação óbvia. Quando a gente pensa em como qualquer criação – especialmente musical – pode ser a alavanca criativa de usuários em
redes sociais, vemos a potencialidade dessas ferramentas. No momento em que a música já é pensada para ser apropriada em redes, como o TikTok, por exemplo, novas possibilidades e oportunidades se abrem.
E oportunidade pode ser uma boa palavra também para definir novas parcerias e colaborações entre músicos e marcas. Já pensou se a Pepsi nos anos 1990,
com o Michael Jackson, tivesse todo aquele dinheiro para investir com todas as possibilidades de territórios novos que temos hoje para explorar? Para o Coy, o
Michael Jackson estaria presente do videogame à HQ, com possibilidades de explorar de formas muito diversas, complementares e incríveis a imagem do artista.
Mas se oportunidade é uma palavra importante para essas parcerias, “encontro” é ainda mais importante. Música tem de criar uma relação verdadeira com a audiência. E como ele salientou durante a nossa conversa no 22000 pés, para usar a música como plataforma de comunicação, ser verdadeiro já é meio
caminho andado e que esses encontros entre pessoas, ideias, amor e um pouco de paixão por música sempre dão certo.
Do papo com o Coy a gente consegue tirar algumas dicas para quem trabalha com marketing e com música nesse contexto em que tudo converge:
- Entender o tipo de conteúdo da rede para aproveitar oportunidades De nada adianta tentar emplacar algo no TikTok sem conhecer a plataforma, as dinâmicas e como é feita essa apropriação do conteúdo musical, seja por lipsync, dança ou remixes. E isso vale para todas as redes sociais.
- Tudo é permitido, desde que esteja alinhado com a sua postura. Pensando em termos de influência, temos aqueles perfis que recebem investimentos pesadíssimos e saem atrás de bater recordes, da mesma forma em que temos microinfluenciadores com uma base de fãs menor, mas extremamente engajados. Para quem trabalha com música é importante que o perfil se adeque à linguagem da rede, caso contrário o retorno do público pode ser bem negativo.
- Marcas e artistas: infinitas possibilidades de comunicação Se tem um território que se expandiu muito foi o da colaboração e parceria entre marcas e artistas. É possível ir muito além do produto licenciado. As tecnologias atuais permitem que a marca explore aquele universo e conteúdo sem ser tão invasiva e, ao mesmo tempo, ter um caráter de apropriação total em territórios onde ela possa apropriar. Para isso, é preciso boas equipes trabalhando para as marcas entenderem o que querem fazer e como querem explorar.
- Música não pode ser um oportunismo de marketing, mas uma oportunidade Formar uma boa equipe de marketing com profissionais que consigam traduzir a marca para a música e a música para a marca é fundamental. É preciso entender internamente quem é a marca, qual é o seu público para conseguir usar a música como plataforma de comunicação e, a partir dela, criar uma relação mais verdadeira com a audiência. Porque parcerias oportunistas não se sustentam.
- Oportunidades para marcas de todos os segmentos Esse momento de pandemia, em especial, é essencial para que outros segmentos, além das bebidas alcoólicas, usem a música como ponte para chegar a um público maior. É a cultura que está trazendo alento durante o isolamento físico com novas experiências que geram vínculos emocionais. Esse é o momento em que marcas mais capitalizadas, como bancos e tecnologia, precisam aproveitar para explorar o território musical. São dicas vindas de um profissional com experiência para ver e aproveitar oportunidades. Além de estar por trás de festivais e iniciativas de música do país, como Skol Beats, o Planeta Terra, o Natura Musical, o Red Bull House of Arts e a plataforma Devassa Tropical, co-criador e curador da Audio, uma das mais importantes casas de show de São Paulo, Coy Freitas é também responsável pela implementação da vertical de música da plataforma Twitch, com canais de artistas como Pablo Vittar, Marcelo D2, Pitty, Criolo e Tropikllaz.
Se quiser conferir a íntegra do nosso papo, que de tão bom teve dois episódios, é só apertar o play:
Ótimos os dois episódios! Boa sacada o que o Coy disse, que a música é uma “trapaça”, uma facilidade que as marcas usam pra conquistar o afeto das pessoas. Quase uma “inception” :)