O último “clac” da montanha-russa

O último “clac” da montanha-russa O último “clac” da montanha-russa

Depois de uma longa fila de espera, tinha chegado a minha vez. Busquei um assento na primeira fileira e me sentei no carrinho. Na frente, apenas o medo de altura e a tensão que precedem a queda brusca. As barras de segurança abaixaram apertando levemente o tronco, mas não mais que as batidas aceleradas de dentro do peito.

Não se trata de algo literal, falo das montanhas-russas que cada um enfrenta na vida: a doença na família, o divórcio, uma eventual demissão do emprego, entre tantas outras. Muitas delas vem juntas, sem aliviar qualquer tensão.

Assim foi minha mudança para São Paulo. Difícil, intensa, diferente do que eu esperava (e não que esperasse algo fácil). Logo de início, o baque: a perda de uma pessoa muito importante. Isso somado às viradas de noite no trabalho, algumas doses de desrespeito, um total desconhecimento do mercado sobre a minha história. “O que eu vim fazer aqui?”, me perguntava.

Mudar de cidade é nos ver arremessados para longe do que conhecemos. Principalmente, pelo que conhecemos sobre nós mesmos. É ter as certezas jogadas de um lado para o outro, ver a confiança ficar de ponta-cabeça, a autoestima despencar de uma altura de um prédio de 10 andares.

Em alguns momentos, não senti meus pés no chão. E não falo como uma analogia a um sonho, mas da sensação de não ter apoio. Ouvia uma crítica, um problema, uma ameaça, e não tinha a quem recorrer. À distância, não há o cinto de segurança da família e dos amigos para segurar o tranco. Os problemas se somam e giram em looping na nossa cabeça. Nos tornamos um trem desgovernado sobre quem somos.

Essa distância só potencializa a sensação de isolamento. É difícil ver as pessoas comemorando datas ou se encontrando em eventos corriqueiros sem você. A gente precisa se acostumar com a nossa ausência na vida de quem gostamos.

Apesar de tudo, me sinto um privilegiado. Por vezes, fui acolhido com carinho por pessoas improváveis, amigos do acaso. Gente que, pela empatia, me ajudou a segurar a barra. Pessoas que transformaram o frio na barriga em um quentinho no coração.

Aos poucos, as coisas foram entrando nos trilhos. Fiz de São Paulo minha casa. Dos novos amigos, uma morada. A família, que lá de longe torce e acompanha, continua fundamental. A emoção do encontro ao fim da aventura é a confirmação de que, mesmo diante de tantas voltas, tudo vale à pena.

Depois de seis anos, me sinto mais acostumado aos sobressaltos. Nem tudo passa dentro da gente. Mas agora, mais adaptado, percebo que é possível aproveitar o passeio. É hora de levantar os braços, curtir o percurso, gritar a plenos pulmões. O último “clac” da montanha-russa também pode ser o começo de algo indescritível.

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